Em 1969 (informa o Google que foi em
20 de julho – há exatos 50 anos, logo mais), quando desceu da nave espacial que
tinha pousado na lua e deu seu primeiro passo em solo lunar, o astronauta Louis
Amstrong disse a frase que se tornou famosa: “esse é um pequeno passo de um
homem, mas um grande passo para a Humanidade”.
Sabendo que as “devidas proporções sempre devem ser mantidas”, essa frase me vem à cabeça sempre que penso sobre a produção de energias renováveis no Piauí. Não resta a menor dúvida que produzir energia eólica e solar ou outro tipo de energia renovável, em qualquer lugar do planeta, é um grande passo para a humanidade. Tenho me perguntado é o que isso tem significado para o Piauí, em termos econômicos, sociais e mesmo de fortalecimento de uma “cultura ecológica”.
Tenho acompanhado os dados sobre o crescimento da participação da energia eólica e solar na matriz energética do Brasil. Não tenho os dados sobre o perfil da matriz energética, se considerarmos apenas a produção de energia no Piauí. Provavelmente, as energias renováveis tenderão e representar um percentual maior que no Brasil, pois só temos Boa Esperança como geradora de energia hidroelétrica e não temos termoelétricas.
Talvez a energia que produzimos em território piauiense ainda não atenda o consumo de 3.316.118 MWh que tivemos em 2018 - 49,93% de consumo residencial, 21,77% de consumo comercial e 4,89% de consumo industrial (dados da CEPRO – Conjuntura Econômica – Anual 2018). Mas autossuficiência não é problema diante do bom sistema de integração de transmissão que o Brasil possui.
O problema, de um lado, é o impacto econômico e social da crescente produção de energias renováveis no PIB e na distribuição de renda no Piauí; e, de outro lado, sobre o uso no Piauí da energia que circula na rede, inclusive a colocada por nossas fontes geradoras.
Em novembro sai o cálculo do PIB estadual e em dezembro do PIB dos municípios do Piauí relativo a 2017. Provavelmente, vamos poder aquilatar o peso da produção de energia eólica que até 2016 só aparecia, com pequeno aporte, no PIB de Parnaíba e Ilha Grande. O impacto da energia solar só vai começar a aparecer no cálculo do PIB de 2018.
Um problema sério já é conhecido. Pela legislação tributária o ICMS de energia fica para os estados e municípios consumidores e não produtores. Aliás, esse é o bom modelo do IVA (Imposto de Valor Agregado) defendido para todos os produtos e que não consegue ser implementado no Brasil. Duas alternativas: dividir a tributação entre estados produtores e consumidores enquanto não mudar a legislação para todos os produtos. São Paulo resiste, pois não quer partilhar com o Paraná o que consume de Itaipu.
A segunda alternativa é argumentar que energia eólica e solar usa “recurso natural de um território determinado”, semelhante aos recursos minerais, e portanto deveria ter algum “royalty” a partir dos MWh produzidos.
Até o momento, a produção de energia eólica e solar tem produzido ISS para os Municípios, no momento de implantação das torres e das placas. A energia solar tem pago arrendamento pelo uso das terras; a solar tem comprado a terra. Tem-se notícia de que está havendo uma concentração do arrendamento pago pela aquisição das terras por comerciantes ou grandes proprietários. E quanto à geração de emprego, é razoável no momento de implantação, reduzindo-se drasticamente no momento de manutenção. Não dá pra ser diferente. Um bom programa de orientação dos pequenos proprietários que arrendam suas terras daria um bom impacto em termos de distribuição de renda. Bem como a qualificação de mão de obra para serviços complementares. Um programa “casado” com os investimentos concretos que estão sendo executados ou estão programados.
Tem havido preocupação em produzir, no Piauí, a base física das torres e no futuro até as próprias placas solares. Aí sim, teremos impacto em nossa riqueza.
Mas, o maior impacto da energia solar no mundo todo e no sul do Brasil, por exemplo, está sendo a geração e consumo descentralizados – comunitário ou doméstico. Precisaria ver as potencialidades desse tipo de expansão da energia solar no Piauí. Interessa a empresas maiores?
Finalmente, é preciso situar o “grande passo da Humanidade” na caminhada concreta do povo piauiense. Como combinar a produção de energia de fonte limpa com a melhoria da transmissão e da distribuição.
Não se trata apenas do velho problema que o Luz para Todos ajudou a resolver em grande parte: energia em linhas de alta tensão passando em cima de casas sem energia elétrica em baixo. Agora, na proximidade de torres ou de placas, embora em menor quantidade que antes.
Trata-se sobretudo de ouvir as reclamações constantes das entidades e lideranças empresariais da falta de energia disponível para ampliação dos negócios existentes ou atração de novos negócios. Ou de diretores de escolas de que a potência energética que chega não segura computadores e ar condicionado ligados ao mesmo tempo. Ou de agricultores e suas lideranças de que a energia monofásica não dá para puxar a motobomba da irrigação. O que avançamos nesses pontos? Fico com a sensação de que muito pouco, pelo que escuto. Não conheço os dados sobre crescimento da transmissão e distribuição.
Geração limpa sim – viva a energia renovável! Transmissão e distribuição suficientes sim – viva a energia disponível! Se não, “ grande passo para a Humanidade” será apenas “um pequeno passo do nosso querido Piauí”!
Antonio José Medeiros
Sociólogo, professor aposentado da UFPI