A pandemia do coronavírus não trouxe apenas o receio de contrair a doença, nem as mudanças no modo de se relacionar com as pessoas, na rotina de trabalho; ela também afetou o psicológico das pessoas, mexendo com a saúde mental e física. Enquanto alguns estão aproveitando esse tempo para se cuidar mais, outros estão cada vez mais ansiosos e preocupados, o que tem desencadeado crises de ansiedade, depressão e insônia.
Segundo uma pesquisa feita por uma empresa farmacêutica, no Brasil, houve um aumento de quase 60% nas vendas de fitoterápicos no mês de maio deste ano, se comparado ao mesmo período do ano passado. Houve produção de 188 mil unidades de produtos que aliviam os sintomas da ansiedade e da insônia no período. Aliás, a palavra “insônia” teve aumento de 130% nas buscas feitas no Google nos meses de abril e maio. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 18 milhões de brasileiros sofrem de ansiedade no País.
Leia também: Medo da pandemia compromete saúde mental
Mas, como driblar os efeitos da ansiedade, depressão e da insônia em meio à pandemia? A psicóloga Cinara Brito de Oliveira explica que, antes de tudo, a insônia pode ou não ser um sintoma da ansiedade e destaca que existem inúmeros fatores que contribuem para o surgimento desses sintomas.
“A própria situação de isolamento e/ou distanciamento social [pode acarretar no surgimento dos sintomas]; existem diversos medos e incertezas que nos afetam cotidianamente, como o medo de contrair o vírus; o medo da própria morte ou de pessoas queridas; o medo do desemprego; a angústia da possibilidade de trabalhar; a incerteza de como serão as coisas daqui para a frente, esses são alguns exemplos. Agora o que fazer sempre depende de cada caso”, comenta.
Cinara Brito destaca que é preciso compreender as causas dos sintomas, que variam de pessoa para pessoa, mas o medicamento pode ser uma estratégia importante, desde que devidamente prescrito por um profissional. Em determinados casos, a psicoterapia pode ser a melhor alternativa, ou até mesmo a junção das duas formas de tratamento.
Inúmeros fatores contribuem para o surgimento de sintomas como depressão, insônia e ansiedade (Foto: Freepik)
“É bastante comum as pessoas confundirem medicamento fitoterápico com fitoterapia. Sempre que se tratar de um medicamento, mesmo que fitoterápico, deve haver prescrição médica, pois apesar de se tratar de um medicamento produzido exclusivamente a partir de matérias-primas ativas vegetais, como a própria Anvisa define, mas com a tecnologia da indústria farmacêutica e, como todo medicamento, o seu uso pode apresentar riscos”, explica a psicóloga.
Medidas alternativas
Para aliviar as tensões causadas pelo isolamento social, algumas pessoas têm aproveitado para, literalmente, colocar a mão na massa. Muitos descobriram dotes culinários, outros enveredaram pelo artesanato, como pintura de quadros e artigos de decoração. Essas alternativas mais lúdicas têm colaborado para que os dias sejam mais leves para algumas pessoas.
Mas a psicóloga enfatiza que essa válvula de escape pode funcionar para uns e para outros não. “Não existe uma regra universal que servirá para todas as pessoas. Para muitas pessoas, isso pode soar como uma exigência ou até mesmo uma cobrança. Se para a pessoa for importante se manter ocupada e isso fizer bem para ela, ótimo, mas talvez muitos precisem justamente de descanso nesse momento. Precisamos nos atentar para o hiper produtivismo, o ócio também pode ter uma função importante para a nossa saúde mental, pode nos possibilitar olhar para dentro, prestar atenção nas nossas emoções e a encontrar saídas criativas para as situações geradoras de sofrimento”, frisa Cinara Brito.
Atenção e cuidados com a qualidade e regularidade do sono
O estado emocional provocado pelas circunstâncias envolvendo a pandemia da Covid-19 está aumentando os casos de distúrbios do sono, o que requer mais atenção e cuidado em relação à saúde. Segundo estudos realizados na França e nos Estados Unidos, houve um aumento de casos no qual foram identificados o crescimento de pacientes com dificuldades para dormir.
“Percebemos esse aumento, mas ainda estão sendo conduzidos alguns estudos no Brasil. Na França, uma pesquisa apontou que 74% dos entrevistados têm algum problema para dormir. Antes da pandemia, o percentual era de 49%. Nos Estados Unidos, o número de pessoas que dormem entre 7 e 8 horas caiu de 54% para 49%”, explica a neurologista Daniela Vianna Pachito, especialista em medicina do sono.
Leia também: Saúde mental: veja como se cuidar durante a pandemia
A médica afirma que nos quadros de insônia, a qualidade e questões envolvendo a regularidade do sono são os principais problemas e queixas verificados junto aos pacientes após o início da pandemia. “A pandemia trouxe preocupações como risco de adoecer, luto pela perda de familiares e amigos, preocupação sobre trabalho e renda. Todos estes estressores contribuem para o aparecimento ou agravamento dos sintomas de insônia. Além disso, a imposição do isolamento social modificou a rotina das pessoas, em termos da regularidade dos horários de acordar e dormir, a prática de atividade física e as atividades sociais. Este fato é um fator adicional para a piora do sono”, ressalta Daniela.
Consequências
Daniela Pachito alerta ainda que é importante ficar atento, já que esse quadro a longo prazo pode provocar outras enfermidades e afetar a qualidade de vida dos pacientes com transtorno do sono.
“No curto prazo, a insônia pode agravar ou predispor a transtornos depressivos e ansiosos, comprometer a capacidade funcional e qualidade de vida. No longo prazo, insones com redução do tempo de sono apresentam aumento do risco de diabetes, doenças cardiovasculares e redução da expectativa de vida”, afirma a médica.
Dicas
Dessa forma, Daniela Pachito orienta sobre a importância de alguns cuidados e, caso a situação demonstre algum agravamento, a necessidade de buscar apoio de um profissional.
“É importante ter uma rotina estruturada, evitar dormir durante o dia ou fazer outras atividades na cama. No período noturno também se deve priorizar uma alimentação leve e evitar a ingestão de cafeína, uso de álcool e tabagismo. No entanto, se persistirem os sintomas é importante procurar um profissional e realizar um tratamento por meio de terapia cognitivocomportamental ou, em alguns casos, até adotar o uso de medicamentos hipnóticos e sedativos com cautela”, explica Daniela.
Por outro lado, a médica alerta para os riscos de automedicação na tentativa de solucionar os problemas relacionados ao sono. “O uso de qualquer medicamento deve ser feito com orientação médica, principalmente, sedativos que podem se associar a eventos adversos como sonolência residual durante o dia, risco de quedas, impacto sobre o raciocínio e memória, além de, em alguns casos, se associarem ao risco de abuso e dependência”, afirma Daniela.