Um trabalho essencial, que exige responsabilidade e dedicação, muitas vezes é visto com maus olhos pela população em geral. É assim que se pode definir a profissão de gari, ainda marginalizada por um grande número de pessoas. Se não fosse por eles, o trabalho de recolher os restos de comidas, produtos de limpeza e sujeiras diversas para depois organizar e colocar tudo separado dentro de sacolas na porta de casa seria em vão. Se não fosse o coletor de limpeza responsável para levar os resíduos que crescem em um curto espaço de tempo em todos os lugares, transitar pela cidade seria uma tarefa quase impossível. Para lembrar dessa profissão essencial no dia a dia de todas as cidades, anualmente, em 16 de maio, comemora-se o Dia do Gari. Este ano, a data será celebrada amanhã, segunda-feira.
O trabalho puxado, no entanto, é tratado com leveza e alegria por Raimundo Nonato de Sousa, de 39 anos. “O serviço em geral é bom porque a gente passa o tempo e faz os serviços que nem vê, o pessoal é brincalhão e é como se a gente fosse uma família porque passamos a maior parte do dia juntos’, destaca.
(Foto: Elias Fontenele/ODIA)
Conhecido como “Touro” por seus colegas de profissão, ele trabalha há 18 anos como coletor e é o mais antigo profissional da região Sul da cidade. Todos os dias ele acorda, se arruma, bate a porta de casa e segue caminho para o trabalho. Para ele, o maior desafio é a responsabilidade. “A gente tem um horário de entrar e de sair no trabalho e devemos cumprir, devemos ser responsável”, ressalta.
Antigamente, Touro dava aulas de capoeira nos horários em que não estava trabalhando como coletor pelas ruas da cidade, mas resolveu parar. Agora, ele sonha em fazer o curso de Educação Física e mudar de profissão. “Eu terminei o ensino médio a pouco tempo e estou pensando em prestar vestibular”, revela. Entretanto, pensar em dedicar-se aos estudos, não faz ele sequer imaginar sair da profissão que atua a tanto tempo. “Eu gosto do que eu faço. Meu salário consegue suprir a necessidade da minha família e minha profissão é digna”, destaca orgulhoso.
Dedicação torna-se exemplo a ser seguido pelos colegas
Há nove anos atrás, Cicero Rocha, acordava diariamente 4 horas da manhã. Natural de Nazária, zona rural de Teresina, se ele perdesse o primeiro ônibus que passava próxima a sua casa, não conseguiria chegar a tempo no trabalho.
Atrelado ao emprego, o jovem de 29 anos, esforçava-se para dar continuidade aos estudos. “Eu saía do trabalho 2 horas da tarde e chegava em casa às 4, para de noite estudar. Eu tinha muita dificuldade porque não tinha tempo para estudar, eu já ia para a aula muito cansado’, afirma. Mesmo assim, ele conseguiu concluir o ensino médio e segue a vida estudando e se capacitando.
Apesar do pouco tempo como gari, Cícero pôde perceber o quanto seu trabalho era importante e isso fez ele se dedicar ainda mais. “Para mim, o gari é aquele órgão mais importante do corpo. Ele não é visto e você só vai lembrar dele quando acontece alguma coisa. Eu duvido se você lembrou do seu pulmão hoje. E o gari, você só vai lembrar quando ver um lixo jogado na rua”, compara.
A dedicação, a pontualidade e a vontade de aprender de Cícero refletiram no seu crescimento profissional. O atual encarregado dos serviços de limpeza da Superintendência de Desenvolvimento Urbano da Zona Sul de Teresina tornou-se um exemplo a ser seguido pelos colegas. Até chegar ao cargo que ocupa hoje, Cícero já foi gari, fiscal de equipe, chefe de capina e até mesmo comandante geral dos serviços de limpeza da cidade. “Eu tenho orgulho de dizer que eu comecei como gari’, enfatiza o profissional.
Invisibilidade social do profissional da limpeza ainda é uma realidade
Antônio José é maranhense, natural de Peritoró. Ele mudou-se para Teresina há 13 anos quando perdeu seu pai. Pouco depois de chegar na capital piauiense, ele foi acolhido por uma nova família. “Eu fui adotado e comecei a estudar, mas na época eu não cheguei a me formar”, conta AJ, como é conhecido por seus colegas de trabalho.
Buscando uma oportunidade de trabalho, AJ recebeu a proposta de trabalhar como gari, na função de coletor. Com quase 10 anos de profissão, ele afirma que preconceito da sociedade para com o seu trabalho ainda é muito forte e que muitas pessoas, quando passam por um gari, fingem que não estão vendo ninguém e quando estão próximas ao caminhão que coleta lixo, procuram desviar o caminho. “Eu creio que 30% das pessoas pensam que essa profissão não é digna”, acrescenta. Mas isso não faz com que AJ pense em procurar outro serviço. O profissional orgulha-se do que faz.
AJ esforça-se para seguir
nos estudos. Ano passado
ele terminou o ensino médio
e garante que continua
estudando para prestar vestibular
e tentar ser aprovado
para o curso de Direito.
Enquanto a realização do
sonho não vem, AJ acorda
todos os dias pensando na
sua profissão atual com paz
no coração. “Eu tenho que
pensar a minha profissão
todos os dias para eu poder
desenvolver ela todos os dias
bem”, revela.