Os dois policiais militares acusados do homicídio de Claudia Silva Ferreira, arrastada por uma viatura da PM por 300 metros na Zona Norte do Rio, ainda não foram julgados, seguem trabalhando normalmente e, desde março de 2014, quando o crime aconteceu, já se envolveram, juntos, em outras oito mortes durante operações — todas registradas como homicídios decorrentes de intervenção policial, os autos de resistência.
No período, Rodrigo Medeiros Boaventura, que à época era tenente, foi promovido após o assassinato de Claudia: hoje, é capitão. Já o sargento Zaqueu de Jesus Pereira Bueno — que, até fevereiro passado, estava lotado no 41º BPM (Irajá) — participou de uma operação que terminou com um suspeito morto apenas quatro meses após o assassinato da auxiliar de serviços gerais. Hoje, o crime completa quatro anos. Claudia, mulher, negra e moradora de uma favela, como a vereadora Marielle Franco, executada anteontem, deixou quatro filhos.
Claudia foi arrastada por 300 metros na Estrada Intendente Magalhães Foto: Divulgação
No total, o capitão Boaventura se envolveu em dois homicídios durante operações no período; Bueno, em outros seis. Os dois foram indiciados pela Polícia Civil pela morte de Claudia em julho de 2014. A denúncia contra os dois por homicídio doloso só foi recebida pela Justiça em março de 2015. Desde então, o processo corre na 3ª Vara Criminal. Os policiais sequer foram pronunciados.
A primeira morte em que Bueno se envolveu após o crime aconteceu no Morro do Chaves, em Costa Barros, também na Zona Norte do Rio, em 15 de julho de 2014. Na ocasião, ele alegou, na 39ª DP (Pavuna), onde o crime foi registrado, que, após trocar tiros com traficantes, encontrou, “caído ao solo um homem pardo não identificado, portando uma espingarda calibre 12 em bandoleira”. Bueno também relata ter levado o homem para o Hospital estadual Carlos Chagas, onde foi atendido, mas não resistiu.
Desde então, o sargento se envolveu em mortes em várias favelas da Zona Norte: Chapadão, Morro do Engenho, Morro do Dezoito e Juramentinho. O homicídio mais recente registrado por Bueno aconteceu em 2 de fevereiro deste ano, no Chapadão.
Já Boaventura se envolveu numa ocorrência com duas mortes no dia 8 de outubro de 2015, em Quintino, também na Zona Norte. Na ocasião, o oficial participou de uma perseguição com tiroteio após o roubo de uma carga de cigarros.
Claudia deixou quatro filhos Foto: Reprodução
Várias operações em favelas
Desde a morte de Claudia, há vários registros da participação dos dois policiais em diversas operações em favelas com trocas de tiros apreensões. A primeira registrada pelo capitão Boaventura após o crime aconteceu em junho de 2015, no Morro do Urubu, quando o oficial apreendeu um fuzil após tiroteio. Já Zaqueu fez duas prisões em outubro de 2014, mesmo ano do crime, no Morro do Chaves.
Além de Boaventura e Bueno, os subtenentes Adir Serrano e Rodney Archanjo, o sargento Alex Sandro da Silva e o cabo Gustavo Ribeiro Meirelles também respondem pelo crime de fraude processual, por terem modificado a cena do crime, removendo Claudia, já morta, do Morro da Congonha.
O vídeo que mostra Claudia sendo arrastada pela viatura da PM pela Estrada Intendente Magalhães foi revelado pelo EXTRA. As imagens mostram a mulher pendurado no para-choque do veículo apenas por um pedaço de roupa. Apesar de alertados por pedestres e motoristas, os PMs não pararam. Antes Claudia havia sido baleada no pescoço e nas costas em meio a uma operação do 9º BPM no Morro da Congonha, onde morava.
A família de Claudia, cansada de conviver com a lembrança da mulher baleada a poucos metros da porta de casa, deixou a favela. O viúvo, Alexandre da Silva, e os filhos da auxiliar de serviços gerais fizeram um acordo com o governo, receberam uma indenização e se mudaram para a Zona Oeste da cidade.