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A Escócia poderia ficar na União Europeia?

Celso Pires - Advogado

23/01/2020 12:27

Uma União Europeia sem o Reino Unido, mas com a Escócia. Uma afirmação que pode soar estranha, no entanto os resultados das eleições britânicas levantaram a possibilidade de um segundo referendo de independência, que permitiria aos escoceses, caso a opção separatista saia vitoriosa, permanecer no bloco econômico. A primeira-ministra da Escócia, Nicola Sturgeon, pediu ao governo do Reino Unido para negociar a transferência de poderes para o Parlamento escocês, o que permitiria ao país organizar um referendo de independência agora em 2020. Para Sturgeon, o resultado das eleições gerais de 2019 — nas quais o seu Partido Nacional Escocês, obteve 48 das 59 cadeiras possíveis no Parlamento — torna indiscutível o apoio a um novo referendo. O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, é contra a realização de outro referendo, alegando que o que foi realizado em 2014 deve ser respeitado — na ocasião, 55% dos escoceses rejeitaram a saída do Reino Unido, contra 45% que votaram pela independência. Dado que a ampla vitória de Boris Johnson praticamente garante a saída do Reino Unido da União Europeia agora em 31 de janeiro, o objetivo da Escócia é deixar a união britânica e se reintegrar como Estado-membro do bloco europeu. Embora a permanência no Reino Unido tenha saído vitoriosa no referendo escocês de 2014, o referendo para o Brexit, a saída da União Europeia, realizado em 2016, mudou esse cenário. Na Escócia, 62% dos cidadãos foram contra deixar o bloco europeu, enquanto 52% dos eleitores britânicos votaram a favor do Brexit. O Partido Nacional Escocês considerou isso como uma mudança de circunstâncias que justificaria uma segunda consulta sobre a independência, uma vez que a Escócia seria forçada, em razão dos percentuais supracitados, a deixar o bloco contra sua vontade. Tem havido um longo debate jurídico sobre se o Parlamento Escocês poderia aprovar as leis necessárias para que haja uma nova votação sobre independência, pois em tese é o Parlamento Britânico, em Westminster, no qual a Escócia tem 59 vagas, que deveria aprovar essa lei. De qualquer forma, a primeira ministra escocesa quer que o governo do Reino Unido concorde em transferir os poderes para o Parlamento Escocês para permitir que exista um referendo, assim como aconteceu em 2014. Assim, segundo a líder escocesa, isso garantiria que o resultado do referendo fosse considerado legal e legítimo por todos, especialmente pela União Europeia. Todavia, o primeiro-ministro Boris Johnson, junto a outras figuras importantes do seu governo, se opõe a isso e diz que não haverá referendo pela independência nos próximos cinco anos. Se seus argumentos políticos não fizerem Johnson ceder, Sturgeon não descarta levar o caso à Justiça. Situação arriscada, uma vez que o sucesso não é garantido e pode levar um tempo considerável, entretanto alguns acreditam que pode funcionar. A outra opção seria conseguir uma vitória esmagadora nas eleições para o Parlamento escocês em 2021, o que catapultaria a demanda por um referendo e aumentaria a pressão sobre o governo britânico. Dados de opinião coletados apontam para um aumento de apoio à independência, no entanto, não tendo ainda a maioria dos votos. De uma maneira geral, as pesquisas apontam para 51% dos votos contra a independência, excluindo os indecisos, e 49% a favor. Na prática, a Escócia não se tornaria independente imediatamente após uma vitória do "sim" nas urnas. Primeiro, deveria haver um período de transição. Em 2014, os defensores da independência afirmaram que levaria 18 meses para criar um Estado escocês independente. Mesmo que o referendo fosse realizado o mais breve possível, a transição demoraria o suficiente para o Reino Unido concluir a sua saída completa da União Europeia. Isso significa que a Escócia deixaria a U.E. com o resto do Reino Unido — e precisaria se candidatar para ingressar no bloco europeu novamente. A Escócia teria que passar por todos os trâmites de qualquer outro Estado que pretenda fazer parte da União Europeia, apesar de ter a vantagem de ter sido um membro recente. Os critérios de acesso envolvem uma série de questões como moeda, níveis de déficit e fronteiras. Sturgeon já abordou essas questões, argumentando que a Escócia poderia continuar usando a libra esterlina inicialmente — e que a situação financeira do país poderia ser ajustada dentro do marco econômico europeu. No entanto, em termos práticos isso pode levar vários anos. A primeira-ministra ainda quer evitar barreiras na fronteira entre a Escócia e a Inglaterra. A realidade é que as respostas sobre essas questões e muitas outras só serão verificadas em detalhes com o amadurecimento de todo esse processo que se avança.

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