Você já imaginou morar em um local onde não há acesso à informações da sua cidade, bairro ou comunidade? Essa é a realidade de milhares de pessoas que vivem em municípios considerados “desertos de noticias”. No cenário midiático brasileiro, os desertos de notícias são regiões desprovidas de veículos de comunicação locais, como rádios, TVs, sites e impressos, o que priva a população de ter acesso a informações sobre o que ocorre em seu entorno.
No Piauí, esse problema é acentuado. Segundo levantamento recente realizado pelo Atlas da Notícia, o estado é o maior do Brasil em números de desertos de notícias. Em mais de 76% do município, as pessoas não possuem acesso a notícias locais produzidas por veículos de suas próprias regiões. Esse vácuo informativo compromete o acesso a conteúdos, tornando as populações mais vulneráveis a notícias falsas, por exemplo.
De acordo com o último censo, dos 224 municípios piauienses, 172 deles carecem de qualquer veículo de comunicação local. A falta de perspectiva monetária da população e a escassez de políticas públicas são fatores intrínsecos que contribuem para a existência desses desertos de notícias.
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Sobre o assunto, conversamos com o professor e jornalista Orlando Berti, especialista em comunicação local, regional e comunitária. Ele destaca que a maioria dos desertos de notícias está ligada à falta de políticas públicas e baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) nos municípios.
“Os desertos de notícias estão ligados às próprias faltas de políticas públicas. Se pararmos para perceber, boa parte desses municípios têm um baixo número de IDH, ou seja, quando o município é muito pobre, o deserto de notícias é quase umbilical”, aponta o professor.
O especialista destaca que os desertos de notícias atacam diretamente a chamada “cidadania midiática”, que diz respeito à liberdade de opinião e de expressão da vontade política, através do acesso à informação. Sem isso, a população não consegue saber, por exemplo, quem são os candidatos às prefeituras dos municípios e quais são as suas propostas de governo.
Segundo Orlando Berti, para reduzir os desertos de notícias é essencial investir em educação básica e fortalecer emissoras públicas para combater esse problema. “Essa realidade pode ser mudada em dois grandes sentidos: no sentido da via educacional e com políticas públicas comunicacionais, com o fortalecimento de emissoras públicas, por exemplo. Se temos escolas bem estruturadas e com bons professores, naturalmente teremos mais perspectivas de cidadania”, explica.
Atualmente, mais da metade dos municípios brasileiros ainda são considerados desertos de notícias, sem acesso a meios jornalísticos locais. O Atlas da Notícia revela que 51% dos 5.570 municípios brasileiros carecem de veículos de comunicação, afetando 30 milhões de pessoas. Além disso, 30% desses municípios, onde habitam 34 milhões de brasileiros, possuem apenas um ou dois veículos de comunicação, correndo o risco de se tornarem desertos.
Jornalismo comunitário é alternativa para combater desertos de notícias
Os desertos de notícias representam um desafio para a democratização da informação no Brasil, demandando ações concretas que possibilitem o acesso à informação e a promoção da cidadania midiática nas regiões afetadas. Neste contexto, o jornalismo comunitário pode ser um forte aliado no combate ao deserto de notícias no país.
Na zona sul de Teresina, a Rádio Verona, uma voz comunitária ativa há 26 anos, é um exemplo desta abordagem que prioriza a divulgação de informações locais precisas e acessíveis à população. Em entrevista ao Jornal O DIA, o jornalista Francisco de Assis, membro da Rádio Verona, explica que, em um mundo cheio de fake news e desinformação, informações cruciais sobre questões do dia a dia, como saúde, serviços públicos e reclamações, muitas vezes não chegam onde deveriam.
Em média, cerca de 2 mil ouvintes acompanham diariamente a Rádio Verona. A iniciativa busca combater a visão de que apenas grandes veículos de comunicação podem informar, mostrando que o meio comunitário tem o poder de estabelecer uma ligação próxima com a realidade das pessoas. Este é o verdadeiro propósito do jornalismo comunitário: levar a informação mais próxima da comunidade e torná-la compreensível, contribuindo para a democratização do acesso à notícia.
“A gente quer comunicar de forma mais simples, em uma linguagem coloquial que as pessoas possam compreender. Nós surgimos principalmente para isso, trazer às pessoas a verdadeira informação, de forma que possa existir uma empatia entre a rádio e o nosso ouvinte”, acrescenta o jornalista.
O papel do jornalismo comunitário é essencial na disseminação de informações corretas e na construção de uma conexão empática com as comunidades. A Rádio Verona e outras iniciativas semelhantes estão provando que a verdadeira informação pode ser transmitida de forma acessível e eficaz, desempenhando um papel vital na luta contra os desertos de notícias.
Leia mais sobre o assunto na edição desta terça-feira (26) do Jornal O Dia.