Após a decisão do Congresso Nacional de derrubar o veto do presidente Lula à Lei 14.784/2023, e promulgar o texto que reduziu para 8% a alíquota de contribuição dos municípios ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o Tribunal de Contas do Piauí demonstrou confiança na manutenção das cidades nos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS). Especialistas da área e côrtes de contas pelo Brasil temem uma migração em massa dos municípios para o regime geral da previdência, o que poderia aumentar o rombo bilionário que atinge o INSS.
Uma possível transferência de servidores municipais para o regime geral poderia aumentar o déficit do INSS. Estimativas apontam que em 2023 o déficit ficou em R$ 311 bilhões. O texto aprovado pelo Congresso reduz de 20% para 8% a contribuição patronal dos municípios com até 156,2 mil habitantes. A medida foi vetada por Lula, mas foi restabelecida pelos parlamentares. Anualmente somente com as prefeituras no regime geral o INSS tem um rombo de aproximadamente R$ 4 bilhões. A queda na alíquota aumentará a disparidade.
Atualmente o Piauí conta com 71 RPPS, sendo 70 no âmbito dos municípios, com dois regimes em extinção, e um no âmbito do Estado. Com 30% do estado em regimes próprios de previdência, cerca de 156 cidades piauienses serão beneficiadas com a lei aprovada em Brasília. Estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta que a redução de alíquota de contribuição atingirá 5,3 mil municípios no Brasil que hoje estão no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), representando uma economia de R$ 11 bilhões por ano para ao menos 5.366 cidades.
Hoje, os quatro maiores regimes próprios de previdência do Piauí, o do Governo estadual, e das prefeituras de Teresina, Parnaíba e Picos somam quase 52 mil beneficiários. Juntos, os quatro regimes tiveram uma receita superior a R$ 3 bilhões. Nas três maiores cidades do estado, por exemplo, a média da alíquota patronal paga pelos municípios é de 19%, quase o triplo do percentual estabelecido na nova legislação.
Porém, uma espécie de “debandada” dos regimes próprios motivados pela economia da redução da alíquota não seria tão simples, como explica Inaldo Oliveira, diretor de Fiscalização de Pessoal e Previdência do Tribunal de Contas do Piauí.
A extinção do RPPS é tarefa complexa, em razão dos fatores envolvidos. Além de manter os aposentados do RPPS em extinção, os gestores municipais devem recolher ao INSS, que administra o RGPS, a compensação previdenciária dos servidores que para lá serão migrados, além de perder a receita de contribuição desses servidores, que na prática mantém o pagamento dos servidores já aposentados.
Uma vez extinto o RPPS, o cálculo do benefício pago pelo RGPS sempre será por média, e em alguns casos teria o fator moderador, fazendo com que o benefício fique menor ou igual à média, mas nunca no valor do último salário. Essa situação faria com que nas contas municipais sejam assumidas as diferenças entre o salário que o servidor se aposentou na prefeitura e aquele pago pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) que superar o salário mínimo. Ou seja, caberá ao município assumir as despesas sem as respectivas fontes de receitas, uma vez que elas serão todas vertidas para o INSS.
Uma lei complementar deve definir as consequências de uma extinção, até o momento o Ministério da Previdência definiu isso em um trecho da lei aprovada.
Para o Auditor de Controle Externo do TCE, Alex Sertão, o preço da extinção também deverá falar mais alto no retorno dos municípios para o regime geral.
“O governo foi contra essa lei que surgiu na Confederação Nacional dos Municípios (CNM). Eles querem modificar essa alíquota patronal de 20% para 8%. O problema é que os municípios poderiam fazer esse caminho de volta, eles se sentem incentivados a extinguir esses regimes. Hoje a situação dos regimes próprios pelo Brasil são insustentáveis em decorrência do déficit atuarial. A impressão que eu tenho é que o custo para esse retorno também é muito caro”, afirmou.
Boqueirão do Piauí já iniciou extinção
Em meio ao cenário de estabilização de regimes próprios três cidades do Piauí fizeram o caminho contrário. Barreiras, Porto e Boqueirão.
“Dois municípios do Piauí criaram e depois revogaram a RPPS, Barreiras e Porto do Piauí. Temos Nossa Senhora dos remédios que está em extinção, as consequências da extinção é uma coisa demorada, ao contrário do que muita gente pensa. A extinção tem repercussão nas finanças dos municípios por um tempo. Tem um conjunto de regras. O município de Boqueirão fez uma audiência pública também para extinguir o fundo. Essa ideia se fundamentou na ideia de redução de alíquota”, explicou Inaldo Oliveira.
Tendência de aperfeiçoamento
Para os técnicos do TCE, o caminho dos municípios deve ser outro, a expectativa é que as cidades do Brasil aperfeiçoem os regimes próprios de previdência, elevando a gestão dos regimes.
“Hoje a tendência é trabalhar uma melhor governança e gestão dos RPP’s e fazer com que o dinheiro das previdências possam ser usados para investimentos e ter um retorno. Às vezes o município não tem dinheiro nenhum e os regimes de previdência têm. Então, a possibilidade dos fundos investir em imóveis, por exemplo, ela existe. Estamos vendo esse aperfeiçoamento dos fundos, hoje não se pode mais criar RPP’s”, concluiu Inaldo Oliveira.