Conviver com a incerteza. É esta a realidade de quem vive em imóveis, sejam casa ou apartamentos, não regularizados em Teresina. Habitar um espaço sem ter em mãos algum documento que comprove que você é o dono ou que pode morar ali é uma situação delicada, mas bastante comum na realidade de Teresina. É o que afirma o tabelião Ilimane Oliveira Fonseca, tabelião da 5º Serventia Extrajudicial de Tabelionato de Notas.
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De acordo com ele, mais de 50% dos imóveis de Teresina estão irregulares perante a administração municipal no que diz respeito aos seus registros, escrituras e matrículas. São casas, apartamentos e estabelecimentos comerciais que ainda não foram regularizados pelo poder público e cujos moradores ou proprietários não possuem qualquer documento que comprove sua titularidade. A maioria deles está nos conjuntos habitacionais e residenciais construídos pelo Governo.
Quando se fala em matrícula de um imóvel, se está falando na “certidão de nascimento” daquele espaço. No número de matricula consta informações como a localização do imóvel, suas dimensões, lote e quadra, dados do proprietário, registros de averbações, ações judiciais, inventários, compras e vendas e alterações pelas quais os imóveis passaram ao longo do tempo.
A matrícula é diferente da escritura do imóvel. Ela é uma declaração pública que registra a transferência do bem de uma pessoa para outra. Quem emite a escritura do imóvel é o cartório de notas e quem paga por ela é quem compra o bem.
O tabelião Ilimane Oliveira Fonseca explica que o processo para regularização de um imóvel é simples e pode ser feito direto no cartório sem intervenção judicial. “Mesmo não havendo documento formal, é possível regularizar o imóvel por meio de usucapião administrativo. Ele transforma a posse em propriedade. É possível o tabelião ir até o imóvel, tomar testemunhos, declarações de vizinhos, fazer um levantamento mostrando que o morador está lá há 10, 15, 20 anos, pegar todo esse indício da posse e lavrar uma ata notarial para dar início ao procedimento de regularização”.
Segundo o titular a 5º Serventia Extrajudicial de Teresina, na capital, o número de usucapião mínimo justamente porque as pessoas desconhecem seus direitos e o quanto o processo é simples de dar entrada. Ilimane lembra que, a partir da regularização do imóvel, é possível conseguir financiamentos bancários fazer o dinheiro circular.
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Mas a falta de informação não é a única barreira que impede um avanço da regularização dos imóveis na capital. Uma reclamação comum nas filas de atendimento dos cartórios é sobre os custos da burocracia documental. Os chamados emolumentos são as custas cartoriais, ou seja, as taxas cobradas pelos serviços prestados nos cartórios. Estes valores são diferentes das custas judiciais. Estas são a soma dos valores decorrentes das despesas com a tramitação de um processo e a prestação de serviço pelo Poder Judiciário.
As tabelas de custas e emolumentos do Piauí foi atualizada pelo Tribunal de Justiça do Estado em janeiro de 2024. Conforme o documento, processos como o de registro de imóveis podem custar de R$ 377,32 a R$ 6.668,17, de acordo com o valor do imóvel. O tabelião Ilimane Fonseca pontua que o tamanho da propriedade não interfere nas taxas notariais.
Serviços como separação, divórcio, dissolução ou reconhecimento de união estável consensual e sem bens custam R$ 177,33 no Piauí. Reconhecimento de firma por assinatura e arquivamento de firma custam R$ 6,29. Autenticação de cópias custam R$ 4,05. Emissão de certidões negativa e positiva por pessoa física ou jurídica individual custa R$ 27,82. No caso de certidão negativa de casal ou da pessoa jurídica com no máximo dois sócios, este valor sobe para R$ 34,82. A segunda via de registro de imóveis custa R$ 34,82.
Confira aqui os valores das custas notariais no Piauí.
Morosidade dos serviços torna os processos mais caros
Há pelo menos 10 anos a professora Jéssica Soares luta para conseguir transferir para o nome de sua avó, Teresinha dos Santos Pessoa, o registro de imóvel da casa onde a senhora de 80 anos vive. Ela é dona de uma residência no bairro Porto Alegre, zona Sul de Teresina, mas a propriedade ainda se encontra no nome de seu primeiro dono, uma senhora que hoje vive na cidade de Castelo do Piauí.
Depois da primeira dona e antes de chegar em dona Teresinha, o imóvel teve mais um proprietário. Para que a propriedade da casa seja passada para o nome da senhora, é preciso que ele seja transferido primeiramente para os proprietários anteriores. É este processo que se arrasta há mais de uma década e que vem preocupando Jéssica não só pela demora, mas também pelos gastos que ele implica.
A professora conta que já gastou mais de R$ 8 mil entre taxas notariais, custas judiciais e viagens para conseguir resolver o imbróglio e transferir para o nome de sua avó a casa onde ela vive. “A primeira dona do imóvel mora no interior e eu precisei viajar para lá duas vezes, mas não consegui encontrá-la. Só com documentos e processos já investir de R$ 8 a R$ 9 mil. No cartório sempre dizem a mesma coisa: precisa da assinatura da primeira proprietária para dar andamento no processo. Pedem muitos documentos, mas sempre esbarra nisso. A gente gasta e gasta e sente que é à toa”, explica Jéssica.
O tabelião Ilimane Fonseca explica que a demora judicial da qual muitas pessoas reclamam se dá por conta de um equívoco. “As pessoas vinculam o cartório à Justiça. Mas sim, registro de imóvel ainda é um processo moroso no Piauí. Um registro que era para sair em 30 dias por lei está saindo em dois a três meses. Isso vem ocorrendo porque recentemente tivemos muitas divisões circunscricionais dos cartórios de modo que os tabeliães não conseguem, de primeiro, avaliar a demanda para mitiga-la”, explica Ilimane.
A dissolução dessa demanda, segundo o tabelião, pode se tornar mais eficiente a partir de agora com a outorga e investidura dos aprovados no concurso dos cartórios do Piauí. No começo deste ano, aconteceu no Tribunal de Justiça a sessão de escolha das serventias judiciais pelos aprovados. Ao too, 259 candidatos aprovados puderam escolher entre as 229 serventias vagas no Piauí.
Na primeira sessão, foram escolhidas 132 serventias; 126 candidatos declinaram da escolha e 97 serventias não foram escolhidas. Houve ainda uma renúncia. Ilimane Fonseca explica que é natural essa quantidade de declinações tendo em vista que este foi o primeiro concurso dos cartórios do Piauí e que só a partir de agora será possível avaliar as regiões que de fato comportam ou não um cartório.
“Esse desinteresse dos candidatos se deu em serventias que não têm viabilidade econômica. O concurso dos cartórios tem um mito muito forte de que a remuneração é muito alta. Você tem serventias que são deficitárias e tem delas em que o tabelião paga para trabalhar. É uma realidade em todos os estados. Isso não chega a ser um empecilho para a qualidade do serviço notarial, porque se você tem cidades onde não tem viabilidade econômica nem demanda para um cartório, isso acaba sendo natural”, explica Ilimane.
O tabelião fala em necessidade de reduzir a estrutura notarial para dar mais eficiência quando se fala em algumas serventias que não têm mais razão de ser. “Acredito que no primeiro momento o TJ fará um estudo e vai identificar quais serventias têm condições econômicas de se manter e quais não têm. Pelo andar da carruagem e a experiência em outros estados, eu acredito que estes cartórios que fiquem vazios sejam atendidos pelos municípios contíguos. Essa é a tendência natural”, finaliza Ilimane.
A reportagem do Portalodia.com procurou o Tribunal de Justiça do Piauí e questionou o que será feito nas serventias notariais não escolhidas pelos aprovados no concurso e que permanecem sem um tabelião titular. Segundo a corte, quando a serventia não é escolhida, o local permanece com um tabelião interino. Além disso, o tabelião concursado pode participar da re-escolha de cartórios nas próximas etapas. Uma segunda audiência está marcada para ele mês.
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