Olhos marejados e atenção plena. Essa é a postura de Marcos Antônio Leal, de 53 anos, ao entrar na pequena sala improvisada no canteiro de obras do Residencial Conquista, na zona sudeste de Teresina. Depois de um dia puxado de trabalho, ele deixa as ferramentas de lado e abre os cadernos. É aluno do projeto Escola Nota 10, desenvolvido por uma construtora na capital. A iniciativa oferece aulas de alfabetização e desenvolvimento socioemocional para trabalhadores da construção civil.
“Na época de estudar, eu não tive oportunidade. Surgiu essa agora e agarrei com gosto. Estou aprendendo o que não aprendi lá atrás, porque precisei trabalhar cedo. Hoje, aprendo pra um lado, aprendo pro outro e ainda ganho no final do dia. Pra mim, está sendo uma bênção”, diz seu Marcos.

Ele é pedreiro há mais de 30 anos e começou a trabalhar ainda muito novo. “Ou trabalhava ou passava fome. Só tínhamos a minha mãe. Meu pai nos abandonou cedo, eu era o mais velho e tive que ganhar o mundo para ajudar em casa”, relembra. Hoje, Marcos tem a chance de aprender o que, por muito tempo, pareceu distante e de transformar sua própria trajetória.
A sala de aula fica ali mesmo, no canteiro de obras, ao lado da estrutura em construção. As aulas acontecem três vezes por semana, às segundas, quartas e quintas-feiras, e duram uma hora e meia. No conteúdo, estão português, matemática, escrita e, surpreendentemente, meditação. Sim, respiração consciente e foco no presente agora fazem parte da rotina desses trabalhadores.

“A gente relaxa muito no momento da meditação. A mente, cansada e estressada, aqui encontra paz. E com esse relaxamento, a gente consegue abrir mais a mente para aprender e focar nos estudos”, conta. “A gente é mais lento, porque estamos aprendendo, mas eles têm paciência. Estou achando muito gratificante ver essa dedicação em nos ensinar com tanto gosto.”
Quem conduz esse processo é o professor Renan Matos, que já havia participado do projeto em 2022. “É muito realizador fazer parte disso. Eles têm níveis diferentes de aprendizagem, então fazemos uma diferenciação pedagógica. Cada aluno trabalha a partir do nível em que está evoluído”, explica.

A construção civil, historicamente, atrai trabalhadores com baixa escolaridade. É uma realidade que ainda persiste no setor. O projeto Escola Nota 10 busca oferecer não apenas conteúdo, mas uma jornada. “Usamos metodologias ativas, como o mindfulness, que ajudam na leitura emocional. Não é só ensinar a ler e escrever, é preparar emocionalmente esses homens para o mundo.”
No momento da contratação, são coletados dados sobre o nível de escolaridade dos trabalhadores. Assim, é possível identificar aqueles que ainda não foram alfabetizados. Atualmente, a turma conta com quatro alunos ativos, mas há espaço para até 18 operários.

Os alunos que desejarem dar um passo além terão a oportunidade de se inscrever no Encceja, exame que garante certificação do ensino fundamental ou médio.
No fim, talvez seja isso que o Escola Nota 10 ensine de forma mais silenciosa: que nunca é tarde para começar. E que aprender, quando se tem vontade, é tão revolucionário quanto levantar um prédio do chão.