O Ministério Público, por meio do promotor Sávio Eduardo Nunes de Carvalho, ofereceu denúncia contra o ex-servidor do Tribunal de Justiça do Piauí, João Gabriel Costa Cardoso, acusado de invadir o sistema PJe do Tribunal para inserir documentos falsos e alterar sentenças de processos. O esquema, segundo a polícia, teria inclusive o envolvimento de advogados.
João Gabriel desempenhou atividades de estágio supervisionado e ocupou cargo em comissão no Centro de Apoio ao Gabinete de Desembargadores, bem como no Núcleo de Apoio às Unidades Judiciárias de 1º e 2º Graus entre agosto de 2021 e maio de 2023. Consta na denúncia que ele atuou como principal responsável pela fraude do Sistema O PJe inserindo minutas fraudulentas em processos judiciais para benefício próprio e de terceiros.

As investigações começaram depois que estagiários e servidores do Tribunal de Justiça procuraram a Corregedoria da Corte para denunciar movimentações desconhecidas em processos. Após serem detectadas invasões ao sistema do TJPI por meio de perfis de pessoas que sequer tinham vínculo com o órgão, o juiz Édison Rogério Leitão Rodrigues solicitou abertura de inquérito policial. Foram constatadas falhas de segurança nos perfis de alguns estagiários.
A Polícia Civil solicitou informações à Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação do TJPI, que forneceu uma lista de e-mails utilizados de maneira suspeita no Sistema PJe e que não foram reconhecidos pelos servidores e estagiários da Corte. Foram identificadas pelo menos três pedidos de redefinição de senhas de usuários do sistema vinculados sempre ao mesmo e-mail de uma pessoa desconhecida.
A polícia localizou ainda um número de telefone inserido como informação de segurança ao e-mail. Este número de telefone pertencia à irmã de João Gabriel.

Chamou a atenção da polícia uma das movimentações feitas nos processos do TJPI pelo acusado: a inserção de uma minuta de decisão assinada e posteriormente revogada pelo desembargador Joaquim Dias de Santana Filho, beneficiando João Gabriel, determinando a anulação de quatro questões da primeira fase do concurso para Soldado da Polícia Militar do Piauí e assegurando sua participação na etapa seguinte do certame.
Acusado pesquisou no Google como “alterar o e-mail no PJe”
No decorrer do inquérito, a polícia obteve a quebra de sigilo telemático das contas do Google e da Apple vinculadas a João Gabriel. De acordo com o documento, em 06 de junho de 2023, ele pesquisou no Google o termo “alterar o e-mail no PJe”, o que, segundo a polícia “evidencia a atuação do investigado na troca ilegal de e-mails e senhas de perfis de magistrados e servidores”.

Já no dia 14 de junho de 2023, o IP usado pelo acusado foi identificado durante inserção de decisão falsa no processo que tratava do concurso da PMPI, tendo ele mesmo como parte interessada. Durante a investigação, a polícia encontrou ainda no e-mail de João Gabriel um arquivo nomeado de “ESQUEMA – TJPI” e detectou o uso de VPNs e proxies (servidores anônimos) tanto nas buscas realizadas como nas conexões registradas de forma a dificultar o rastreamento das fraudes.
João Gabriel foi preso em setembro do ano passado. Em depoimento à Polícia Civil, ele confessou a prática dos delitos e disponibilizou dados indicativos do envolvimento de outros indivíduos que teriam se favorecido da invasão ao sistema do TJPI. Ele disse que recebia média de R$ 2 a R$ 3 mil por cada invasão e inserção de documentos falso exitosa. Segundo o acusado, ele continuava tendo acesso ao sistema do tribunal com seu login e senha mesmo depois de anos de ter deixado o órgão.
O Ministério Público o denunciou por invasão de dispositivo informático, falsidade ideológica, inserção de dados falsos em sistema de informação, corrupção passiva, violação de sigilo profissional, fraude processual e organização criminosa.
A reportagem de O Dia procurou o Tribunal de Justiça do Piauí para comentar a situação. O espaço segue aberto para futuras manifestações.
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O que diz o Tribunal de Justiça
Em nota, o Tribunal de Justiça do Piauí confirmou que foram identificadas algumas movimentações fora do padrão no sistema de tramitação processual de unidades específicas. O TJ prontamente bloqueou os acessos e contatou as autoridades policiais e correicionais. À época dos fatos, o sistema de tramitação processual operava na nuvem do Conselho Nacional de Justiça, que adotou as providências necessárias para o fortalecimento da segurança dos acessos ao sistema.
Com o incremento às ações preventivas, o CNJ institucionalizou a autenticação de múltiplo fator, reforçando a segurança e garantindo a plena integralidade e higidez dos acessos.
O Tribunal de Justiça informou, ainda, que em dezembro 2023, realizou a migração do sistema da nuvem do CNJ para uma nuvem própria, contratando um serviço de firewall, que impede ações que tentam disfarçar o verdadeiro endereço IP de acesso aos sistemas. “O acesso noticiado ocorreu por meio de acesso legítimo em nome de terceiros de boa-fé e a situação já está sendo apurada nas instâncias legais, já tendo este Tribunal adotado todas as medidas administrativas cabíveis”, diz o TJPI.
O órgão reiterou que está colaborando ativamente com as autoridades responsáveis e que continuará prestando todas as informações e esclarecimentos necessários para a elucidação dos fatos. As providências que competem ao TJPI foram adotadas no âmbito interno. Questões que ultrapassam a competência administrativa da instituição seguem em tramitação nas instâncias competentes.
“O Judiciário piauiense reitera seu compromisso com a transparência, a segurança institucional e o respeito às normas que regem a administração da Justiça. Por fim, o Judiciário piauiense reafirma a confiabilidade e a segurança do sistema de tramitação atualmente utilizado, que opera sob infraestrutura robusta e com mecanismos avançados de proteção, garantindo a integridade e a proteção dos dados processuais e com adoção de mecanismos contínuos de monitoramento”, conclui a nota.
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