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Genealogia, História e Ecologia em Esperantina

Genealogia, História e Ecologia em Esperantina

30/07/2015 17:11

I PARTE

Dias atrás recebi um e-mail do Valdemir Miranda de Castro, me convidando para umas homenagens que seriam prestadas ao grande piauiense, herói e poeta, Leonardo de Carvalho Castelo Branco, que depois adotou o nome literário de Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco. Haveria um réquiem, um panegírico sobre sua vida e obra e a fundação do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico Leonardo Castelo Branco. Depois recebi um convite formal (impresso) e um telefonema do Valdemir, reforçando o teor do e-mail.

Tive a satisfação de reencontrar ou conhecer ilustres literatos, intelectuais, historiadores e genealogistas, radicados em diferentes municípios, entre os quais cito, pedindo desculpas por eventual e involuntário esquecimento: Dílson Lages Monteiro, Elias Medeiros (o Júnior e o pai), Paulo de Tarso Batista Libório, Assis Fortes, Adrião José Neto, José Luiz de Carvalho, Diderot Mavignier, Antônio de Pádua Marques, Ailton Pontes, Ramon Vieira de Carvalho, João Barros da Silva Filho, Adauto Fortes de Sá Meneses, major Leonardo Castelo Branco e o principal articulador do evento, Valdemir Miranda.

No domingo, dia 12, cedo da manhã, segui para Esperantina, em companhia de meu irmão Antônio José. Não consegui alcançar a missa em intenção da alma do ilustre homenageado, mas cheguei antes do início do panegírico, de modo que o assisti na íntegra. Valdemir, ao sabor do improviso, sem necessidade de anotações, com segurança e domínio de todo o conteúdo, discorreu sobre a vida do homenageado.

Com riqueza de detalhes, falou dos principais acontecimentos e obras de sua longa existência. Enalteceu as suas virtudes e principais realizações. Analisou e interpretou as suas mais notáveis produções literárias. Falou de sua busca inglória do legendário moto-contínuo, ainda hoje por ser inventado, que lhe consumiu boa parte da existência, e que lhe fez despender esforço, labor, tempo e dinheiro.

Também se referiu às suas participações em lutas libertárias, em virtude das quais sofreu mais de uma prisão. Valdemir é a pessoa mais indicada para escrever a mais completa biografia do notável poeta e patriota Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco, cuja rica existência não precisa ser romanceada, porque na verdade já é um romance, cheio de peripécias e de fatos heroicos, quixotescos e interessantes. Leonardo é, no bom sentido da expressão, um legítimo Dom Quixote de carne e osso, cavaleiro andante das causas libertárias piauienses e brasileiras.

Em minha intervenção, após o término do belo panegírico feito pelo Valdemir, seu descendente, outro cavaleiro andante das causas culturais, ambientalistas e de preservação do patrimônio arquitetônico esperantinense, lembrei o belo poema épico moderno “Leonardo” de H. Dobal, de quem tenho a honra de ser o sucessor na Academia Piauiense de Letras – APL, que enaltece e louva a figura ímpar e exemplar do homenageado, em versos extraordinários como os seguintes: “No campo raso vai galopando / Leonardo de Nossa Senhora / das Dores Castello Branco / que também outrora / se assinou de Carvalho. // A vária fortuna de Leonardo / vai governando os astros da manhã. / Leonardo capitão de campo / conhece o nome o nume desses campos (...).”

Ressalto que, tanto nos versos que acima transcrevi, como nos fragmentos do texto historiográfico (em prosa), estes da autoria de F. A. Pereira da Costa, contrapostos às várias estrofes, o nome literário adotado pelo poeta e herói aparece como sendo “Leonardo de Nossa Senhora das Dores”, quando na verdade deveria ser Leonardo da Senhora das Dores. De qualquer modo isso é apenas um mero detalhe, que em nada desmerece o fulgor e a beleza do poema dobaliano e nem o valor e a veracidade do texto em prosa.

Quero lembrar que no ano de 1997 foi publicada a Lei Estadual de nº 4.993, que previa a criação do Memorial Leonardo de Carvalho Castelo Branco. Essa lei, a exemplo do artigo 226 da Constituição Estadual de 1989, que determinava o ensino de Literatura Piauiense, tornou-se verdadeira “letra morta”. Ao longo desses mais de 14 anos nenhuma das sucessivas gestões estaduais executou esses dois dispositivos legais, o que bem demonstra o apreço que os nossos governantes têm pelas coisas e causas culturais e artísticas.

Aproveitei, em meu outro aparte, em que também fiz a apologia de Leonardo, para elogiar a obra Enlaces de Família, de Valdemir Miranda de Castro. Recomendei a sua aquisição aos interessados em história e genealogia. É uma rigorosa pesquisa genealógica dos ascendentes do autor, sobretudo tomando como ponto de partida o grande poeta, inventor e patriota. Mas não é somente isso, o que já seria demais.

Enfoca ainda outras famílias ilustres, no corpo principal, pelas afinidades, ou no apêndice, que ele pretende ampliar, que contribuíram para a povoação do vale do Longá, mormente as que se fixaram em Campo Maior, Barras, Batalha, Esperantina, Piracuruca e Parnaíba. Traz interessantes fotografias e notas biográficas sobre as principais figuras históricas referidas. Elucida o início histórico desses municípios, discorrendo sobre os principais fatos e atos que determinaram a sua criação e desenvolvimento.

II PARTE

Logo após o término do panegírico, o Valdemir Miranda, coadjuvado pelo professor Assis Fortes, passou à segunda parte da solenidade, ou seja, à fundação do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico “Leonardo Castelo Branco”. Vários historiadores, genealogistas e intelectuais presentes (todos já referidos na I Parte), foram considerados sócios fundadores, e assinaram a ata lavrada e lida por Assis Fortes. Esses membros eram naturais de diferentes municípios do Vale do Longá, ou ao menos neles radicados.

Ato contínuo a assembleia passou a deliberar sobre a primeira diretoria da entidade, que foi eleita por aclamação unânime. Para presidente e secretário foram eleitos o Valdemir e Assis Fortes, idealizadores do Instituto. Foi aprovado o brasão criado por mestre Assis, que também é o autor da bandeira, do brasão e do hino de Esperantina. Valdemir comprometeu-se a realizar sessões do Instituto em diferentes cidades do Vale do Longá, naturalmente observando as datas magnas dessas urbes.

Após o lauto almoço, fomos conhecer a antiga casa-grande da Fazenda Olho d’Água (dos Negros ou dos Pires, se o leitor desejar algum desses acréscimos). Do notável e volumoso livro Enlaces de Família, de Valdemir Miranda de Castro, na página 82, colho a seguinte informação: “Fundada por Mariano de Carvalho Castelo Branco, em 1847, tombada como Patrimônio Histórico Estadual e desapropriada pela Prefeitura Municipal de Esperantina (...). O território que a cerca é um assentamento Quilombola. A casa-grande, hoje em ruínas, vem sendo depredada pelos remanescentes agregados da fazenda, e visitantes.”

Na mesma página, consta a fotografia de uma telha, com autógrafo de Mariano, na qual ele registrou a data de seu nascimento: “Hoje quarta-fª, 8 de dezembro de 1847 ajusto 47 anos de idade e três meses de idade”. Por conseguinte, nasceu no dia 8 de setembro de 1800. Essa fotografia, segundo informa Enlaces de Família, foi publicada nos livros Carnaúba, Terra e Barro na Capitania do Piauhy, p. 16, da autoria de Olavo Pereira da Silva Filho, que está indicado para integrar o IHGG Leonardo Castelo Branco, e A Mística do Parentesco – Os Castelo Branco, na 4ª capa, de  Edgardo Pires Ferreira. Leonardo era irmão do fundador do velho solar.

Advirto que se providências urgentes não forem tomadas a casa-grande, tombada pelo órgão do Patrimônio Histórico e Arquitetônico Estadual, irá literalmente tombar, como já caiu a casa solarenga da Fazenda da Limpeza, construída pelo poeta e grande patriota Leonardo de Carvalho Castelo Branco em 1817, na qual nasceu a maioria de seus filhos, entre os quais Teodoro de Carvalho e Silva Castelo Branco, o poeta caçador. É uma construção frágil, uma vez que suas paredes são de adobe. Com a vinda de chuvas, as inúmeras goteiras completarão a ruína que já se propaga a olhos vistos.

Os saques já se alastram. Muitas telhas, janelas e portas já foram removidas. Creio que uma porta, que se encontrava retorcida e fora dos encaixes, só não fora retirada pelo gatuno, em virtude de seu enorme peso, pois era lavrada em grossa e maciça madeira. Seria uma verdadeira cruz e calvário para o larápio que pretendesse conduzi-la, mesmo peça por peça, após ser desmontada.

Mariano parecia ter talento pictórico, pois as telhas possuem desenhos da flora e da fauna local, como macacos, tamanduás, galináceos, jacus, abacaxis, sapucaias, buritis etc. Havia ainda citações da Bíblia, invocação a santos, além de ser traçado o perfil da família, com o registro de seus hábitos e costumes, conforme consignou Valdemir Miranda na página 81 de sua monumental obra genealógica.

Fomos olhar o olho d’água, de onde se originou o nome da fazenda. Foi circundado por uma parede rústica de pedras, aparentemente antiga, e ao que tudo indica sem comprometimento dos veios ou minadouros. Entretanto, a água se apresentava muito barrenta e escura, como se fora toldada por animais ou ação humana.

Foi-nos informado que uma construtora utilizara essa fonte de forma predatória ou danosa, de modo que ela perdera a sua natural limpidez. Fica numa várzea, onde pontificam imponentes buritizeiros. A mata que se espalha pelas encostas dos morros e pelo vale ainda se mostra exuberante, viçosa e muito verde.

Foram tiradas várias fotografias da casa, do entorno, da mata, do olho d’água, do brejo e dos visitantes. Também foram feitas várias filmagens, de vários locais, uma vez que o Elias Medeiros Júnior pretende realizar um documentário sobre essa histórica casa-grande, na qual deve ter estado várias vezes o grande Leonardo, em visita a seu irmão Mariano. O filme deverá registrar a história da vetusta residência e mostrar o seu precário estado de conservação, no intuito de fortalecer a luta em prol de sua restauração, que deverá ser empreendida pelo Instituto.

Elias Medeiros Júnior, misto de jornalista, radialista, ator, diretor cenográfico, ambientalista etc., entrevistou várias pessoas. Fui filmado no quintal da Casa do Olho d’Água, à sombra refrescante de frondosa árvore. Falei que o prédio se mostrava bastante arruinado, pela falta de conservação e pela fragilidade do material de que fora construído. Até invoquei a alma de Leonardo, para que nos transmitisse o seu espírito guerreiro, para melhor defendermos a restauração e preservação do solar arruinado.

Entretanto, ressaltei que o manancial d’água ainda se mostrava perene, e que a floresta e o buritizal da várzea ainda se apresentavam exuberantes e relativamente bem conservados. Ante essas considerações, defendi em meu depoimento a ideia de que esse patrimônio desapropriado pelo Poder Público Municipal fosse transformado num parque de proteção ambiental, e que a antiga casa solarenga fosse transformada numa espécie de museu e/ou pousada.

Com essas providências, estariam salvos a floresta e o buritizal do entorno, a fauna e o patrimônio arquitetônico já tombado. Quando eu concluía meu depoimento, ao entardecer, o canto mavioso e inaudito de um pássaro, que não identificamos, nos encantou em verdadeiro alumbramento auditivo, como um arremate sinfônico de tudo que expusemos. Talvez essa ave canora estivesse estampada numa das telhas da casa-grande.

Resta-me torcer para que os órgãos governamentais a serem contatados não transformem a justa reivindicação em “abacaxi”, através de embaraços burocráticos, e nem os oportunistas da má política demagógica nos deem abraços de tamanduá, conforme Mariano de Carvalho Castelo Branco desenhou nas telhas do vetusto e decrépito solar. Decrépito, mas que ainda pode e deve ser restaurado.

Fonte: Pro Parnaíba
Edição: Geysa Silva
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