A Lei Menino Bernardo, Lei nº 13.010/14, representa um avanço significativo na proteção dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil. Junto ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a lei assegura um ambiente educacional livre de castigos físicos, tratamentos cruéis ou degradantes. Anteriormente conhecida como Lei da Palmada, ela foi promulgada em 2014 para esclarecer a proibição e penalização de práticas que causem sofrimento físico ou psicológico às crianças e adolescentes.
Os principais motivos pelos quais a proibição desse tipo de violência existe é porque o castigo, seja físico ou psicológico contra crianças e adolescentes, traz consequências maléficas ao seu desenvolvimento. Dentre elas, a ansiedade, os transtornos depressivos, o baixo desempenho na escola, comportamento agressivo e violento, síndrome do pânico e quadros depressivos.
Assim, surge a educação positiva, como um contraponto à abordagem punitiva, promovendo métodos que valorizam o diálogo, o respeito mútuo e a compreensão emocional entre pais, educadores e jovens. Esse modelo educacional busca fortalecer os laços afetivos e criar um ambiente de aprendizado que estimula o desenvolvimento saudável e o bem-estar integral das crianças.
“É preciso deixar os pontos bem explicados e ser assertivo na hora de executar alguma atividade. Os pais devem se abrir com os filhos, conversar e mostrar sua vulnerabilidade, ter diálogo e permitir ter empatia e a compreensão, se colocando no lugar da criança. É preciso ter consciência e autocontrole. Os pais batem quando perderam a capacidade de refletir sobre seu autocontrole, então, antes da reação, é importante reconhecer os nossos sentimentos de frustração ou raiva, e respirar fundo pode ajuda a reiniciar o cérebro, pausar, pensar e buscar uma forma de solucionar essa questão. Afaste-se alguns minutos para buscar uma alternativa, tenha calma e converse com a criança usando um tom de voz suave, mas claro e firme, e pratique a escuta ativa. Espere o tempo da criança e deixe ela concluir seu raciocínio”, orienta Andrea Kiss.
Vale destacar também que a educação positiva não se limita apenas ao ambiente familiar, estendendo-se também às instituições educacionais e à sociedade em geral. Encoraja práticas que reconhecem e valorizam os direitos das crianças, reforçando que a disciplina pode ser construída por meio de orientação, exemplos positivos e limites claros, sem recorrer à violência física ou emocional.
Conselho tutelar, um aliado na defesa das crianças e adolescentes
Os conselhos tutelares têm um importante papel na defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes. São esses profissionais que lidam, inicialmente, com as denúncias, se deparam com as situações e, principalmente, com as crianças. As denúncias de violência contra crianças e adolescentes chegam ao Conselho Tutelar por meio de diversos canais, seja pela rede de Saúde, da Educação, pelo Disque 100 ou ainda por demanda espontânea. Quando o conselho recebe uma denúncia de que uma criança está sendo vítima de agressão ou psicológica, nós notificamos à família para ir à sede do conselho tutelar, de modo a verificar a veracidade da denúncia.
O conselheiro tutelar Melquisedeque Fernandes, que atua na região da zona Sul de Teresina, explica como é feito o acompanhamento dessas crianças vítimas de violência. “Uma vez confirmada [a denúncia], as medidas podem variar, desde uma simples advertência até o afastamento da criança do lar familiar onde ela está sofrendo a violação. Também orientamos a comunidade a ligar para a Polícia Militar caso presencie a criança sofrendo violência física”, disse.
As denúncias de violência praticadas contra crianças e adolescentes, recebidas pelo Conselho Tutelar, são repassadas mensalmente para a Coordenadoria de Direitos Humanos. Ao atender uma criança vítima de violência, é realizada a escuta qualificada, por meio de um psicólogo especializado que compõe a rede de acolhimento, de modo a evitar a revitimização.
“Quando recebemos essa denúncia, orientamos a famílias a registrarem o boletim de ocorrência, e, caso não seja feito, o próprio conselho pode fazer o procedimento. Uma vez realizado o boletim, a criança poderá passar por uma escuta especializada. Além disso, o Conselho Tutelar também atua de forma preventiva, por meio de palestras realizada em escolas, centros de convivência e outros espaços, conscientizando a sociedade a educar uma criança ou adolescente sem agressão física. Realizamos também esse trabalho preventivo buscando capacitar as pessoas a identificar os sinais, físico ou psicológico, de que uma criança pode estar sendo vítima de violações”, pontua o conselheiro.
Sinais que identificam a violência:
- lesões no corpo;
- comportamento retraído;
- baixa autoestima e tristeza;
- choro, tristeza, angústia;
- prática de automutilação e ideação suicida;
- queda no rendimento escolar.
“Lamentavelmente, a sociedade ainda tem a compreensão equivocada de que violência contra criança e adolescente é um problema intrafamiliar e que as pessoas não devem se envolver. Porém, muitas vezes, essa criança está sendo vítima de violência cometida por um pai, mãe, tio ou outro parente, a pessoa vê, mas não quer se expor, por medo de ter sua identidade revelada. Frisamos que a denúncia anônima será mantida, o que não pode acontecer é a omissão. E vale lembrar que a omissão é caracterizado como um crime, podendo responder criminalmente dependendo do resultado que essa omissão venha provocar”, acrescenta Melquisedeque Fernandes. Para o conselheiro tutelar, a Lei é um marco no ordenamento jurídico brasileiro, pois visa coibir a violência contra crianças e adolescentes, que muitas vezes é praticada dentro do ambiente familiar como uma alternativa de disciplina. “Os pais, como detentores do poder familiar, acabam se achando no direito de dar um castigo físico para a criança, mas ela, como sujeito de direito, não pode ser vítima de violência”, conclui o conselheiro.
A educação positiva fortalece os laços entre pais e filhos
A educação positiva é uma abordagem que se concentra no fortalecimento dos laços emocionais entre pais, educadores e crianças, promovendo um ambiente de aprendizado baseado no respeito mútuo e na comunicação aberta. Em vez de recorrer a punições severas ou à imposição autoritária, a educação positiva valoriza o entendimento das necessidades e emoções da criança, incentivando comportamentos desejáveis através de incentivos positivos, como elogios e reforços positivos.
Este método enfatiza a criação de um ambiente seguro e acolhedor, onde as crianças se sintam ouvidas e compreendidas, desenvolvendo habilidades sociais e emocionais fundamentais. Ao estabelecer limites claros de forma consistente e amorosa, os pais e educadores ajudam as crianças a desenvolver autocontrole e responsabilidade, preparando-as para enfrentar desafios de forma construtiva ao longo da vida.
Quando Sara Valentina tinha dois anos e meio, a estudante Victória Lima (24) passou a implementar a educação positiva na rotina das duas. Ela conta que, nem sempre, aplicou uma educação foi respeitosa, afinal, ela foi criada em uma educação tradicional, que utilizada métodos de castigo para educar os filhos, além do silenciamento dos sentimentos da criança.
“Reproduzimos comportamentos que aprendemos na nossa criação, então quando minha filha me dava trabalho, eu achava correto gritar com ela, ao mesmo tempo que eu não me sentia bem com isso. Em uma determinada situação eu briguei com a Sara e ela disse ‘Estou com medo de você!’. Foi quando comecei a ler sobre educação respeitosa e entendi que eu precisaria mudar a forma de lidar com minha filha, afinal, eu sou a adulta, pois, como eu daria segurança para ela se eu a assusto com gritos ou palmadas?. Eu sempre disse que não reproduziria as mesmas coisas que passei quando crianças, mas estava fazendo com minha filha. Foi um processo e estou aprendendo a cada dia”, explica.
Victória conta que, após aplicar a educação positiva com a filha, a vida das duas mudou significativamente. A menina passou a se sentir mais confiante e segura com a mãe. Com a educação respeitosa, ela conta que aprendeu a pedir desculpas, principalmente sem culpar a criança, o que gera confiança na filha para ela se abrir com a mãe.
“Não é fácil e nem sempre conseguimos ser respeitosos, pois, ao longo da nossa infância fomos desrespeitados e negligenciados, o que são gatilhos na nossa vida adulta, mas, hoje, quando acontece algo fora do comum, a Sara me fala quando se sente desrespeitada. Damos um tempo para pensarmos e refletirmos e, quando estamos mais calmas, conversamos de forma tranquila. Eu peço desculpas se falei de um jeito não respeitoso e explico o que aconteceu, mas não culpando ela, o que é comum os pais fazerem, justificando a atitude grosseira como sendo culpa da criança”, destaca Victória.
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