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Saúde mental: "eu preciso procurar ajuda"

Jovem conta dificuldades em conseguir auxílio na rede pública da Capital para tratar doenças como depressão, transtorno bipolar e síndrome do pânico.

14/07/2018 09:23

“O sistema ganhou de mim”. É assim que começa o texto postado em uma rede social. A mensagem, que soa mais como um desabafo, foi feita pelo universitário Daniel Pessoa, de 25 anos, que tem transtorno bipolar e síndrome do pânico diag­nosticadas há cinco anos. Na publicação, ele conta sua saga em buscar ajuda na rede pública de saúde, principalmente as dificuldades em conseguir tratamento psicológico e remédios para controlar as crises que costuma ter.

Daniel afirma que foi diagnosticado quando tinha 18 anos, mas, desde criança, apresentava um comportamento diferen­ciado, que, segundo ele, nunca foi levado a sério pelos familia­res. “Eles achavam coisa de crianças, até que um dia eu tentei suicídio e nós procuramos um psicólogo”, lembra o jovem. E começa assim a jornada do estudante em busca de auxílio e tratamento para as doenças. Ele lembra que chegou a fazer um plano de saúde, mas só conseguiu manter por poucos meses devido ao alto valor das mensalidades, lhe deixando apenas uma única alternativa: recorrer à rede pública.

“Minha mãe não conseguiu pagar o plano por muito tempo, então procuramos o Hospital do Matadouro, na zona Norte de Teresina, onde tinha uma psiquiatra que era a única que atendia pelo município todos os dias. Ela atendia em média 30 pessoas por dia, então, não era muito tempo para cada pacien­te. Fui diagnosticado com depressão e síndrome do pânico, fiz o tratamento por dois anos com ela e parei porque comecei a me sentir melhor”, comenta. Pouco depois, o jovem mudou-se para o Pará, onde lá foi diagnosticado com transtorno bipolar.


Daniel culpa o descaso com a saúde pública e mental aos altos índices de suicídio em Teresina (Foto: O Dia)

Ao retornar para Teresina, Daniel fala que buscou novamen­te o serviço, procurando ajuda em um Caps (Centro de Aten­ção Psicossocial). Lá passou por um processo de triagem e preencheu um formulário. “Mas lá é para quem tem problemas psicológicos mais graves, como a bipolaridade e esquizofrenia. Eu só fiquei por uma semana, porque lá não havia uma divi­são da gravidade dos casos e toda a terapia era em grupo. Para mim, isso não tinha serventia e eu me sentia pior, então voltei para a psiquiatra do Hospital do Matadouro”, explica.

Sem acompanhamento de um profissional e pouca medicação para administrar nos horários corretos, o estudante recorreu novamente à rede privada, vez que não podia ficar sem auxílio médico por já ter tido ideação suicida. Mas isso não durou mui­to devido às condições financeiras da família e, em janeiro, pre­cisou cancelar o serviço novamente. Há sete meses sem plano de saúde, Daniel desabafa sobre sua condição psicológica atual e pede um olhar mais atento da cidade para com sua população.

“Estava tendo muita crise de pânico e não conseguia sair de casa, ouvia vozes e tinha alucinação e foi aí que pensei ‘Eu pre­ciso procurar ajuda’”, pontua. Na publicação que fez nas redes sociais, o estudante lamenta o descaso relacionado à saúde mental em Teresina.

“A minha única vontade foi de chorar, nunca me senti tão humilhado em buscar uma ajuda para suportar minhas dores e não conseguir. Quando se perguntam como essa cidade e esse Estado tem o maior índice de suicídio no Brasil, está aí [a resposta], é o descaso com a saúde pública e mental. Uma cidade que lhe oferta nenhum lazer e muito menos um lugar para tratamento das doenças que ela lhe faz ter. O sistema me venceu”, desabafa.


“A minha única vontade foi de chorar, nunca me senti tão humilhado em buscar uma ajuda para suportar minhas dores e não conseguir". 


Provida

Com um ano sem acompanhamento médico e tendo cons­tantes crises de bipolaridade, Daniel Pessoa recorreu ao Pro­vida - ambulatório especializado no tratamento de pessoas com ideação suicida que funciona no Centro Integrado Lineu Araújo e disponibiliza psicólogos e psiquiatra para atendimen­to de pessoas com sofrimento psíquico.

“O Provida foi único lugar que consegui atendimento da última vez e é relativamente bom. Como é um local de pre­venção ao suicídio, era para as pessoas irem para lá e terem o apoio de um psicólogo e psiquiatra, só que o sistema foi mo­dificado, agora tem que fazer uma triagem mesmo já tendo ca­dastro para depois falar com o psicólogo e com o psiquiatra. Para uma pessoa que já tentou suicídio, se tiver que passar por todo esse processo, ela desiste”, comenta o estudante Daniel Pessoa, acrescentando que já tentou atendimento no Hospital Areolino de Abreu, mas não foi bem atendido.

Pacientes se deparam com burocracia e atrasos

O universitário Germanno Mar­ques também buscou ajuda da rede pública para atendimento psicoló­gico. Em 2016, ele foi diagnostica­do com distimia, um tipo crônico de depressão no qual a pessoa fica triste regularmente. É um quadro que pode ser controlado, mas per­siste se o tratamento for suspenso. O jovem conta que apresentava um quadro depressivo desde a infância, porém, a procura por ajuda só veio quando ele ingressou na universi­dade.

“Quando a coisa começou a aper­tar, ou eu buscava ajuda ou a coisa ia ficar feia. Desde então, eu come­cei o tratamento, mas parei diversas vezes, porque eu me trato pelo SUS e é tudo muito burocrático, seja para marcar uma consulta, pegar um encaminhamento, agendar o retorno. Então, quando a situação está apertando, eu procuro ajuda, me trato por um tempo e depois paro, porque é muito desgaste bus­car ajuda e não conseguir, você sai mais cansado do que quando co­meçou. A gente que precisa acordar bem cedo para marcar uma consul­ta e eles ficam te jogando de um lado para o outro”, comenta.

Germanno destaca que já foi ao Hospital Universitário da Ufpi, Hospital Getúlio Vargas (HGV) e no Provida, local onde fez a maior parte do tratamento, e explica que lá é menos burocrático, vez que os retornos podem ser agendados no próprio Centro Integrado Lineu Araújo.


Foto: Shutterstock (Imagem ilustrativa)

O estudante cita ainda que, no HGV, os psiquiatras que atendiam costumavam chegar atrasados, o que causava desgaste e estresse nos pacientes, por isso, a necessidade de ofertar mais pontos de atendi­mentos psicológico em outros lo­cais de Teresina.

“Eu não acho que a quantidade para se tratar atende à demanda da cidade, nem de lugares nem de profissionais e nem o modo como é feito. É um processo muito difícil você admitir que tem um transtor­no, precisa de ajuda e levar em fren­te esse tratamento. O que a gente puder receber de estímulo e incen­tivo seria muito bom, mas isso não acontece. No Provida, é o local que melhor atende, apesar de atender uma demanda específica, mas os métodos como eles tratam os pa­cientes, como eles facilitam as coi­sas, se em outros lugares seguissem o mesmo esquema, seria mais fácil das pessoas buscarem ajuda e con­cluírem o tratamento”, comenta.

Por: Isabela Lopes - Jornal O Dia
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