Portal O Dia - Notícias do Piauí, Teresina, Brasil e mundo

WhatsApp Facebook Twitter Telegram Messenger LinkedIn E-mail Gmail

Perspectiva 2021: eleitos terão a pandemia como principal desafio

Doutoranda em Ciências Políticas projeta ainda os problemas locais que o novo prefeito da capital piauiense deve lidar

31/12/2020 09:15

O ano de 2021 começa em meio a mudanças, sobretudo políticas. Diante dos resultados das urnas, Teresina terá novos partidos e uma nova cara à frente do Palácio da Cidade. E caberá a esses gestores darem continuidade ao enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. Enquanto permeia a possibilidade de uma segunda onda da Covid-19, também se aguarda a regularização e o início da vacinação contra a doença no país.

“Sem dúvida, a pandemia teve um impacto significativo nessas eleições e vai ser o grande desafio para o ano que segue também, porque a gente está vendo que ela não foi de todo vencida, estamos falando numa segunda onda da doença. Então, os eleitos, que vão assumir agora a partir de 2021, terão a pandemia como principal desafio por, pelo menos, até a metade do ano”, projeta a doutoranda em ciências políticas e professora universitária, Beatriz Ribas.

Foto: Arquivo/ODIA

A especialista traça ainda um panorama mais detalhado do que o novo prefeito de Teresina deve enfrentar para atender às expectativas da população. “O gestor que vem terá como desafio amenizar os principais problemas da Capital.

Durante muito tempo, os eleitores teresinenses demonstraram insatisfação com alguns serviços públicos, especialmente o transporte coletivo. Outra coisa que foi bastante discutida durante as eleições foram os problemas de alagamento na cidade. Então, o novo gestor vai ter que olhar mais atentamente para esses problemas em específico. A educação também foi bastante criticada nas eleições, sobretudo em relação ao número de vagas [em escolas], cobertura da política de educação. Por isso, eu acho que esse conjunto de políticas será o grande desafio para 2021, além dos próprios problemas enfrentados pela pandemia”, avalia.

Interior do Estado

Já com relação aos municípios do interior do Estado do Piauí, Beatriz Ribas destaca a arrecadação como principal entrave das novas gestões. “Os municípios menores têm problemas sobretudo de arrecadação. Então, eles têm mais dificuldade para custear políticas públicas, serviços de educação, serviços de saúde, e quanto menor o poder de arrecadação, de tributar o cidadão, menos capacidade o município tem de investimento e fica mais dependente, por exemplo, do auxílio do Estado e da União.

“O eleitorado quer cara nova, políticos mais propositivos”

No âmbito do Poder Legislativo, os teresinenses elegeram, para o mandato de 2021 a 2024, 12 novos vereadores, o que representa uma taxa de renovação de cerca de 40% na Câmara Municipal. Para a cientista política Beatriz Ribas, esse percentual reflete o anseio de mudança por parte dos eleitores em relação aos seus representantes, assim como uma cobrança para que esses eleitos realmente tragam transformações para a cidade.

“Eu acredito que o cidadão teresinense quer ver projetos, os vereadores trabalhando de fato, propondo aquilo que estavam nos seus planos de governo durante a campanha. Com essa renovação de cerca de 40%, o eleitorado tá dando o recado. A gente ver que esse movimento de mudança, de renovação política, vem acontecendo desde 2018. Então, tá cada vez mais difícil para aquelas velhas forças políticas, aquelas figuras políticas mais tradicionais, se manterem com o mesmo comportamento e com o mesmo discurso de antes. O eleitorado tá querendo ver mesmo cara nova e ações novas, políticos mais propositivos”, pondera.

Por outro lado, parte dessa renovação soa mais como um continuísmo político que uma verdadeira mudança de cadeiras, pois há vereadores eleitos que possuem laços familiares com políticos tradicionais. “Apesar dessa renovação, a gente vê que há um continuísmo político. Então, é um filho, uma filha que tá ali dando continuidade ao cargo que era do pai, ou à influência política que o pai tem, ou a esposa que tá dando continuidade ao mandato do marido. Mas a gente também vê que têm figuras novas, pessoas com perfil mais jovem e que ainda não tinham uma experiência, uma trajetória política como outros atores políticos que já atuam no Poder Legislativo”, considera.

Participação da mulher Grandes figuras políticas devem ser mais presentes

Outra tendência revelada pelas urnas discorre sobre a participação da mulher na política. Segundo Beatriz Ribas, esse ainda é um processo tímido, mas que está em evolução. “Em 2020, nós tivemos uma taxa de 33,33% de candidaturas femininas. É a maior registrada durante toda a história política no país. Entretanto, se nós olharmos para o nosso legislativo municipal, a gente passou de quatro para cinco [vereadoras], então é um aumento muito tímido. Mas a gente não pode negar que há sim mais interesse das mulheres em participar da política, talvez falte mais apoio. Elas aparecem ali como vice, mas não como protagonista de uma chapa. Porém, não podemos desconsiderar o mérito dessas mulheres que conseguiram se eleger”, pontua.

A cientista política acredita que o atual cenário da cidade poderia ser transformado se tivéssemos mais mulheres no Legislativo. “Na realidade, o que mudaria com mais mulheres dentro do Legislativo é que elas representariam, sobretudo, as próprias mulheres, pois elas são mais sensíveis às demandas femininas. No caso da deputada Teresa Brito, por exemplo, ela levantou a bandeira do parto humanizado; então, essa é uma bandeira que dificilmente seria levantada por um homem. E, sem sombra de dúvidas, isso influencia também o movimento de outras mulheres na política, dentro do Legislativo, em cargos de gestão, administrativos”, completa.

A tímida participação de figuras políticas mais representativas nas eleições municipais surpreendeu os analistas que agora preveem uma mudança de postura para o pleito de 2022, quando devem ser eleitos presidente da República, governadores, deputados estaduais e federais, além de senadores.

“Nós esperávamos, por exemplo, que Bolsonaro ia fazer mais linha de frente nessas eleições, de chamar o eleitorado, de convocar os eleitores a votarem naqueles candidatos que têm um viés ideológico mais próximo dele. Mas o fenômeno que a gente viu não foi esse. Ele foi mais tímido nessas eleições e isso influenciou também nos resultados”, avalia a cientista política Beatriz Ribas.

A especialista também analisa o enfraquecimento do PT nas eleições municipais de 2020. “Em relação ao Lula, a gente vê que o PT enfraqueceu, falamos que houve um encolhimento do PT, que conseguiu eleger, no Brasil, 183 prefeituras e, no Piauí, o Partido não tem mais tanto essa força política. Porém, esse encolhimento do PT já era esperado, por conta de tantos escândalos, de todo sentimento antipetista que ainda é muito forte para o eleitorado brasileiro”, destaca.

Todavia, para as eleições de 2022, Beatriz Ribas aposta em uma mudança de atitude por parte dessas lideranças políticas. “O que dá para esperar para o pleito seguinte é que essas grandes figuras políticas marquem mais presença. Deve gerar uma preocupação muito grande no próprio PT, que encolheu, por isso, eles devem fazer um movimento de fortalecimento da esquerda caso queiram eleger mais candidatos em 2022. E do mesmo modo Bolsonaro, que também tem que atuar de maneira mais ativa em relação aos seus apoiadores, até mesmo para conseguir ampliar sua popularidade em relação ao eleitorado. A gente deve esperar um comportamento, uma relação diferente, novas articulações ou novas formas de pressão política, visando o pleito de 2022”, conclui.

Fim do personalismo político?

O eleitorado piauiense, quiçá brasileiro, possui uma característica bastante marcante: a de associar política a pessoas e não a todo processo que isso envolve. Porém, na visão da cientista política Beatriz Ribas, este cenário está mudando e pode trazer efeitos a médio prazo.

“No Brasil, ainda há uma característica muito personalista na política e isso se reflete aqui no nosso município e também em nível de Estado, ou seja, as pessoas tendem a se identificar muito com a pessoa que ocupa o cargo, às vezes deixando de lado qual a importância desse cargo, qual seu papel. E é uma característica não só do piauiense, mas do brasileiro, de ser mais apático politicamente, de não participar e não se interessar tanto pelo processo que envolve questões públicas. E

ele [o eleitor] se limita muito aos seus assuntos de interesse privado”, detalha.

“Mas a mentalidade do brasileiro está mudando, as pessoas estão se mostrando mais interessadas em política, elas querem debater mais. Talvez a gente veja os efeitos disso a médio prazo, pois ainda é um movimento tímido, mas está acontecendo. Só que não podemos descartar o efeito corrupção que ocorre, inclusive, no período eleitoral. A gente sabe que ainda há a prática de compra de votos, e eu sempre digo que o nosso eleitorado é muito carente, ele tem necessidades básicas, nosso Estado tem um PIB baixíssimo e isso também influencia, por exemplo, nas práticas ilícitas”, completa.

Por: Virgiane Passos, do Jornal O Dia
Mais sobre: