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Reforma eleitoral esvazia lei da Ficha Limpa e reduz autonomia das mulheres, dizem especialistas

As novas regras precisam virar lei até o dia 6 de outubro para valer nas eleições municipais do ano que vem.

17/09/2023 às 15h18

28/09/2023 às 13h18

Com 367 votos favoráveis e 86 votos contrários a Câmara dos deputados aprovou na última quinta (14) a minirreforma eleitoral que altera pontos importantes da legislação. O texto reduz na prática a eficácia da lei da ficha limpa e abre espaços para que homens utilizem a verba de candidaturas femininas. Todos os deputados do Piauí votaram a favor da matéria, apenas o deputado Jadyel Alencar não compareceu à sessão. As novas regras precisam virar lei até o dia 6 de outubro para valer nas eleições municipais do ano que vem.

Chamado de “minirreforma” o projeto de lei (PL) 4438/23 foi dividido em diferentes eixos temáticos, que passam por alterações no funcionamento das federações partidárias, mudança na prestação de contas e regras da propaganda eleitoral. O projeto também prevê um prazo antecipado para convenções partidárias e registro de candidaturas, permitindo que a Justiça Eleitoral tenha mais tempo para julgar os candidatos antes das eleições. Em outro ponto, o texto altera prazo de criação das federações partidárias para seis meses antes do pleito e prevê que eventuais punições a um partido federado não poderão atingir os demais.

Câmara Federal - (Antônio Cruz/Agência Brasil) Antônio Cruz/Agência Brasil
Câmara Federal

Além do PL 4438/23, que altera a Lei Eleitoral, os deputados analisaram um Projeto de Lei Complementar (PLP) 192/23. O PLP unifica prazos de afastamento de candidatos de cargos públicos e altera a forma de contagem dos prazos de inelegibilidade da Lei Ficha Limpa.

O advogado eleitoral Welson Oliveira avaliou o projeto aprovado na Câmara. “O texto aprovado é um indicativo de uma flexibilização da legislação eleitoral, ele dá mais margem para a utilização dos recursos voltados para as candidatas femininas. Até 2022 a utilização dessa verba era restrito e exclusivo para candidaturas femininas, hoje a gente observa a possibilidade disso ser divido com candidaturas masculinas, principalmente com o dispêndio com material de campanha em conjunto. A gente observa também mudanças na prestação de contas, pois se retirou a obrigatoriedade da prestação de contas parciais”, afirmou. 

Advogado eleitoral Welson Oliveira - (Arquivo Pessoal) Arquivo Pessoal
Advogado eleitoral Welson Oliveira

O operador do direito explicou ainda como a legislação afetará a possíveis condenações por inelegibilidade. “A regra de inelegibilidade também foi alterada, o prazo de inelegibilidade é de oito anos, antes se contava o período do mandato também que aquela pessoa foi condenada. Hoje com a aprovação dessa lei o prazo de inelegibilidade ficará restrito a oito anos, antes existia a possibilidade dessa pena chegar a 11, 12 anos”, finalizou.  

Entre outras medidas, o PL 4438/23 determina transporte público gratuito obrigatório no dia das eleições, com linhas especiais para regiões mais distantes. Uma emenda aprovada na fase de destaques proibiu as candidaturas coletivas, que tinham sido regulamentadas no texto original. O deputado Bibo Nunes (PL-RS) afirmou que as candidaturas coletivas podem levar ao estelionato. “Como um candidato recebe votos de quem votou em outro? Essa é uma enganação”, disse.

Marcelo elogia o texto 

Relator do código eleitoral no senado o senador piauiense Marcelo Castro elogiou a matéria aprovada, apesar das polêmicas. “Quero parabenizar a iniciativa da Câmara, o que eles fizeram já estávamos fazendo no senado. Não há divergência, as medidas melhoram, aperfeiçoam, fica mais claro para a população e impede interpretações dúbias. Estamos lutando contra o tempo, tudo isso terá que ser aprovado antes do dia 06 de outubro. Não sei se será possível”, afirmou. 

Candidaturas de mulheres

Sobre as regras para estimular candidaturas de mulheres, a minirreforma fecha mais o cerco contra as candidaturas-laranja de mulheres, que são lançadas apenas para cumprir a cota de 30% mas não são, na prática, candidaturas efetivas. Elas, agora, serão consideradas fraude e abuso de poder político. As cotas de gênero deverão ser cumpridas pela federação como um todo, e não por partido individualmente.

Os recursos financeiros reservados para campanhas femininas poderão custear despesas comuns com outros candidatos, inclusive propaganda, desde que haja benefício para a candidatura feminina. Essa divisão não é permitida atualmente, como a impressão de santinho que tenha uma candidata mulher e um candidato homem, por exemplo. A medida pode prejudicar as candidaturas femininas na prática. 

O projeto estende para pré-candidatas e mulheres que realizam atividade política as proteções previstas na legislação sobre violência de gênero e cria medidas protetivas para pré-candidatas, candidatas, titulares de mandato e mulheres com atuação política.

Fundo partidário

As novas regras aprovadas na Câmara autorizam o uso de recursos públicos para pagamento de despesas pessoais dos candidatos e para compra e aluguel de veículos, embarcações e aeronaves. O texto simplifica regras para a prestação de contas aplicada às eleições e autoriza partidos a juntarem documentos para comprovar a regularidade das contas partidárias e das campanhas.

Os recursos do Fundo Partidário poderão financiar a segurança de candidatos no período entre a convenção partidária e o segundo turno. Além disso, os recursos Fundo Partidário e do Fundo de Financiamento de Campanha são considerados impenhoráveis e não podem ser objeto de bloqueio judicial.

Sobras eleitorais

A minirreforma eleitoral também mudou as regras para as chamadas “sobras eleitorais”. Atualmente, as cadeiras das Câmaras de Vereadores, Assembleias Legislativas estaduais e da Câmara dos Deputados são preenchidas pelos partidos ou federações que alcançam o chamado quociente eleitoral, que é o cálculo que define quantos votos são necessários para ocupar uma vaga.

Se, por exemplo, forem 100 mil votos válidos para 10 vagas existentes, o quociente eleitoral será 10 mil votos. Esse é o mínimo que um partido precisa ter na eleição para eleger um deputado.

Depois de ocupadas essas vagas pela regra do quociente eleitoral, ainda sobram cadeiras que não foram ocupadas pelos partidos. Afinal, se um partido teve 55 mil votos, ele ganha cinco cadeiras pelo exemplo usado acima, sobrando ainda 5 mil votos.

Essas “sobras”, pela regra aprovada em 2021, eram preenchidas pelos partidos que conseguiram, pelo menos, 80% do quociente eleitoral e pelos candidatos com um número mínimo de votos de 20% desse quociente. Com a mudança aprovada pelos deputados, que ainda precisam ser validades no Senado, apenas os partidos que atingiram 100% do quociente eleitoral poderão participar do cálculo das sobras. Com isso, a regra beneficia os mais votados e que já elegeram deputados na primeira rodada.