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Mãe é quem cuida, a figura materna nem sempre está naquela que nos trouxe ao mundo

O que define “ser mãe” é a convivência diár ia , o respeito e a dedicação àqueles que nos dispomos a amar.

08/05/2022 07:59

Dizem que mãe é quem cria. Quem cuida , dá car inho e proteção. Mas nem sempre esses sentimentos e essa relação materna vêm ou se constroem a partir de laços biológicos. Avós podem ser mães de seus netos. Netos podem ser filhos de tias. Tias podem ser mães de sobr inhos e por aí vai. Consang uinidade não define amor. Muito menos o grau de parentesco o faz. O que define “ser mãe” é a convivência diár ia , o respeito e a dedicação àqueles que nos dispomos a amar.

Nos versos de Conceição Evaristo, o aprendizado: “Foi de mãe todo o meu tesouro, veio dela todo o meu ganho. Mulher sapiência. Do fogo, tirava água. Do pranto, criava o consolo”. Em Mia Couto, o significado de ser mãe: “Na barriga da mãe não se tece apenas um outro corpo. Fabrica-se a alma”. E na boca dos filhos, o reconhecimento: “se tem alguma coisa que me per turba, eu sei que quem vai me acolher é ela. Hoje essa figura materna para mim é minha tia”.

A frase é da maquiadora Marília Nunes. Órfã de mãe e de pai, ela encontrou acolhimento e conforto materno na figura da tia, Socorro Teixeira. O carinho e admiração, ela conta, já existiam antes mesmo da perda da mãe biológica, mas se manifestaram mais fortes quando ela teve que passar pelo luto.

“Desde o início eu vi mudanças nela tanto de aprox imação com a gente [Marília e os irmãos Liara e Wilson], quanto de aber tura para conversar no sentido de tentar entender o que a gente estava passando. A preocupação, o carinho. Ela passou a se mostrar muito mais depois que a mamãe faleceu, coisa que a gente não tinha tanto. Ela era só uma das tias que nós tínhamos, mas essa aprox imação, essa figura de mãe, porque ela já era mãe, eu não conhecia e pude v ivenciar ”, diz Marília.

Foi na tia que ela e os irmãos encontraram um dos maiores pontos de apoio quando da perda de Sílv ia, a mãe biológica, e, posteriormente, do pai, Paulo. Marília diz que a palavra “mãe” é a que melhor define Socorro, junto com acolhimento e compreensão. “Hoje, se tem alguma situação que me per turba, que eu quero conversar e desabafar com alguém, eu sei que ela vai me acolher. Essa figura materna que eu tenho hoje, para mim é a tia Socorro. E não é forçado. Ela abriu os braços e a gente foi encontrando nela esse espaço de muita coisa que falta quando a gente não tem mais nossa mãe aqui. Ela sempre está de braços aber tos e para mim, isso é ser mãe”, finaliza Marília.

FOTO:br.freepik

Mãe de Filhos e Sobrinhos

Dona Socorro Teixeira vem de uma família em que a mãe foi a figura central, uma família matriarcal, como ela mesma diz. Filha mais nova de quatro irmãos, ela conta que o pai lidava com problemas relacionados ao álcool e inevitavelmente se tornou figura um tanto ausente. Coube à mãe, dona Maria Clarisse, ser a grande provedora do sustento da casa. Uma criação centrada na figura materna e que vem sendo replicada agora com os dois filhos biológicos [Mauro e James] e mais quatro sobrinhos: a filha da irmã mais velha que faleceu em 2011; e os três filhos de um outro irmão, falecido em 2012. “Eu venho de uma família muito pequena que era constituída pela mãe, o pai e quatro filhos. Hoje eu sou mãe e a tia Socorro, e isso se dá ao pé da letra por conta da necessidade de comparecer afetivamente e efetivamente com os sobrinhos que são filhos dos meus irmãos e que eu amo incondicionalmente”, diz.

Socorro afirma que ser mãe de filhos e sobrinhos é um exercício diário do olhar com um misto de gratidão. Gratidão, por ter sido ela a escolhida para acolher aqueles a quem chama de “parte que ficaram de seus irmãos”. Como se fosse um presente que, embora seja doloroso pelas circunstâncias com que veio, se resume em extensão de si, compromisso, coração e confiança. Socorro traduz o ser mãe de filhos e sobrinhos como o conforto de saber que cuida e que também é cuidada por aqueles que ama. “Eu estou sempre acompanhada e acho que essa coisa de cuidar está se refazendo: eu já me sinto mais cuidada do que sendo a cuidadora. E essa troca, esse amparo, essa ideia de saber que estão ali tanto meus filhos biológicos quanto os filhos dos meus irmãos me dá a certeza de que se fosse diferente, se eu tivesse ido antes, eu estaria tranquila sabendo que tenho essa família que foi costurada no amor e no respeito. Acaba que ser mãe termina sendo essa coisa indecifrável de acolher ao mesmo tempo em que se é acolhida”, finaliza Socorro.

FOTO: Arquivo Pessoal

Avó é Mãe em Dobro

Avó é mãe duas vezes. Quem nunca ouviu essa frase na vida? É cuidado redobrado que transborda em forma de proteção e cumplicidade. No caso da vendedora Joyce Lima, 34 anos, a avó é muito mais que amor em dobro: é aquela que lhe criou, lhe ensinou tudo que sabe e a quem ela chama de “mãe”. É literalmente o nome de dona Luciene Lima que consta como mãe no registro de nascimento de Joyce, embora ela tenha sido gerada pela filha dela, Regina Cláudia. Joyce nasceu na cidade de Crateús, no Ceará, mas se mudou para Teresina quando tinha 13 anos. Filha biológica de Regina Cláudia Lima, ela foi criada na verdade pela avó, dona Luciene. É que quando ela tinha só 8 meses de vida, sua mãe se mudou para São Paulo em busca de melhores oportunidades de trabalho e de uma forma de poder dar uma vida melhor para a filha.

 Em São Paulo, Regina acabou conhecendo o homem que viria a ser seu futuro marido e se mudou com ele para a Espanha. Mesmo com a distância física, ela nunca deixou de manter contato com a filha e com a mãe, dona Luciene. E foi a mãe dela que ensinou tudo que Joyce sabe, que a criou e a cuidou a vida inteira, assumindo para si a responsabilidade materna. É o nome de Luciene que consta como “mãe” na certidão de nascimento de Joyce. Mas a maternidade, nesse caso, vai muito além de um mero registro. “Eu vejo minha avó como minha mãe e a chamo de mãe. Ela que cuidou de mim em toda situação, ela que sempre foi minha mãe. Eu fui a primeira neta dela. Os filhos dela, meus tios, já estavam crescidos e tinham saído de casa, então eu meio que fiquei como filha única para ela”, conta Joyce. Aos 13 anos, quando Joyce se mudou para estudar em Teresina e morar na casa de uma tia, as duas tiveram que se separar. Mas mesmo vivendo em Estados diferentes, o carinho e cuidado não arrefeceram. 

A maior prova de que amor de mãe não tem prazo de validade e de que amor de avó é o de mãe em dobro, veio quando Joyce engravidou e teve Juliana. Biologicamente falando, Juliana é bisneta de Luciene, mas a considera avó, e Joyce faz questão de que essa relação não se perca. “É uma coisa que não vou esquecer nunca: quando eu tive a Juliana, todo o cuidado que ela teve, o amor que ela teve comigo e a Ju, a paciência para me ensinar as coisas por eu ser mãe de primeira viagem. Ela me ajudou a criar a Juliana também, eu tive toda a assistência dela na gravidez. Ela veio para Teresina e foi quem tomou de conta da minha filha nos primeiros meses me mostrando como fazer e como cuidar dela. Ela cuidava da Juliana como cuidou de mim. Isso é ser mãe”, finaliza Joyce.

FOTO: Arquivo Pessoal


Filha de duas Mães

Tias que se tornam mães de sobrinhos, avós que criam netos como filhos e filhos com mais de uma mãe. A expressão “mãe de criação”, nunca fez tanto sentido como na vida de Layanny Borges. Desde criança, ela foi criada pela tia avó, dona Maria Nazildes (Zilda), porque a mãe biológica, Lucileide Borges, trabalhava no comércio e precisava passar a maior parte do dia fora de casa. A distância entre as duas casas era de apenas uma rua e nem mesmo o distanciamento da mãe biológica, durante o dia ou às vezes durante toda a semana, impediu Layanny de criar com ela um laço maternal de carinho, amor e proteção. Distinções, ela afirma, nunca existiram. “Eu sempre tive contato com as duas, só que durante a semana eu ficava na casa da tia Zilda, que é minha mãe de criação, e no final de semana eu ficava com minha mãe biológica, que é a Lucileide.

 E assim foi até a fase adulta, porque ela trabalhava o dia todo e quando chegava eu já estava dormindo. Minha educação foi mais com a tia Zilda, porque ela sempre esteve mais presente, mas eu tenho as duas como figura materna”, explica Layanny. Com o passar do tempo, a avó biológica acabou se tornando mãe de criação também. Hoje, Layanny tem duas filhas, Maria Eduarda e Maria Júlia, e elas passam mais tempo com a avó, dona Lucileide, do que com a mãe pelos mesmos motivos de antes: o trabalho e a correria do dia acabam dificultando uma presença maior. “A história vai se perpetuando, porque minha mãe biológica, que não pôde ter esse contato maior comigo por causa do trabalho, já pode ter com minhas filhas. A minha menina mais velha, a Maria Eduarda, ela que criou até mais ou menos 8, 9 anos. Eu passava o dia trabalhando e só chegava em casa para dormir. Depois de uns 11, 12 anos foi que ela veio morar comigo, porque eu já não morava mais com minha mãe”, explica Layanny. Para ela, a máxima do “mãe é quem cria”, não precisa ser levada ao pé da letra quando há boa vontade, amor e esforço para que as duas partes, mães e filhos, estejam juntos independentemente das situações.

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