Se locomover dentro de Teresina nos últimos meses se tornou um verdadeiro teste de resistência. A redução da frota de ônibus que circula na capital somada à péssima estrutura das paradas e até a dificuldade em se conseguir transporte alternativo – carros de aplicativo – tem testado a paciência de quem não possui meios próprios de ir e vir.
Estações de ônibus de Teresina estão abandonadas - Foto: Assis Fernandes/O Dia
Em alguns períodos do dia, o tempo de espera por um ônibus em Teresina chega a até uma hora e meia e para aqueles que precisam transitar entre zonas opostas, o ideal é sair de casa com horas de antecedência para tentar a sorte e encontrar um ônibus. É esta a realidade da professora de Química Luane Lustosa. Quando não consegue pegar ônibus, o que acontece quase todos os dias, ela chega a pagar até R$ 30,00 em aplicativos de carro para chegar ao destino.
“Eu moro no Lourival Parente, faço mestrado na UFPI e gasto muito com transporte de aplicativo porque não consigo pegar ônibus. Geralmente pego carona com minha prima de casa até a Miguel Rosa, lá espero uma hora para pegar um ônibus pra Frei Serafim e aqui é outra espera longa pra pegar o ônibus pra universidade. Tenho que sair com três horas de antecedência de casa e a conta, no final, sai alta, porque na maioria das vezes, o único jeito é chamar um carro”.
Luane Lustosa chega a esperar até uma hora por um ônibus em Teresina - Foto: Assis Fernandes/O Dia
A realidade de Luane é a mesma do fisioterapeuta Fabrício Nunes, que todos os dias precisa se deslocar do bairro Vermelha, onde mora, para a Pedra Mole, onde trabalha. Além do tempo de espera, ele reclama da falta de estrutura dos ônibus e das paradas da capital. “Está tudo abandonado, principalmente essas paradas da Frei Serafim e aquelas estações que construíram outro dia nos corredores exclusivos: está tudo depredado, um caos. E quanto aos ônibus, quando não falta, vem os piores que têm, todos quebrados e dando defeito”, afirma.
Fabrício chega a gastar até R$ 40,00 com carros de aplicativo a cada vez que não consegue pegar ônibus, ou seja, paga 10 vezes mais que o valor da passagem inteira. E até mesmo quando usa os coletivos, os gastos não diminuem. É que na falta dos ônibus comuns com bilhetagem eletrônica, resta a ele pegar os alternativos que foram disponibilizados pela Prefeitura para suprir a queda na frota. O problema é que esses veículos não possuem maquineta de cartão e nem fazem integração, aceitam somente a passagem em dinheiro.
“Não tem nem como integrar, ainda mais pra alguém como eu que vai de uma zona a outra todo dia. De que adianta colocarem ônibus alternativos pra suprir a falta de ônibus comum se não equipam eles com os mesmos sistemas? Ou você tem dinheiro na mão pra ir trabalhar ou você não sai de casa”, dispara Fabrício.
Fabrício Nunes reclama da estrutura das paradas e dos ônibus - Foto: Assis Fernandes/O Dia
Até carro por aplicativo está difícil na capital
Quem desiste do transporte público e aposta nos aplicativos de corrida particular para se locomover por Teresina também tem que tentar a sorte: as reclamações da dificuldade em conseguir carro na capital se tornaram mais frequentes, sobretudo nos últimos meses com o aumento da gasolina. É que com o combustível no preço que está, nem toda corrida compensa para os motoristas, daí eles recusarem os chamados ou cancelarem pouco depois de aceitar. Às vezes aparece uma corrida com preço maior e eles acabam abrindo mão daquela com o trajeto e o valor mais curto.
Soma-se a isso as taxas praticadas pelas empresas de carro particular. Em Teresina, no atual momento, há quatro aplicativos operando no setor do transporte a pedidos e alguns cobram valores menores que outros pelo quilômetro rodado. Isso influi diretamente no preço que será recebido pelo motorista ao final da corrida, daí eles preferirem operar naqueles serviços que ofertam valores que compensam o trajeto. Isso explica a ausência de motoristas em determinados aplicativos e, consequentemente, a menor quantidade de carros disponíveis em certos horários.
Foto: Assis Fernandes/O Dia
“E sobre a taxa de deslocamento, tem algumas menores que outras, então o motorista vai optar pela maior, por isso eles rodam mais por um aplicativo que em outro. Tem deles que não gostam de receber no cartão, porque demora a cair na conta e às vezes eles precisam do dinheiro na hora pra botar gasolina. Não é interessante, por exemplo, pegar uma corrida de 2 Km paga no cartão”, explica o motorista de aplicativo Rafael Miranda.
Também contribuiu para a dificuldade em se conseguir motorista particular em Teresina a reabertura das atividades econômicas. Isso, porque muitos motoristas estavam rodando por aplicativo como alternativa de renda à suspensão contratual ou demissão durante a pandemia e com a volta de vários setores, eles acabaram abandonando o serviço. Além disso, há também o fator segurança: em certos bairros de Teresina como Santa Maria, Promorar e Vila Santa Cruz, os motoristas recusam corridas a partir das 19 horas por causa do risco de assaltos.
“Tem várias regiões aqui que a gente não entra até por ordem do próprio crime. E se entra tem que ser de vidro abaixado, farol aceso e se identificando. Já cheguei com passageiro em um bairro daqui que eu só entrei, porque conheciam ele lá, porque senão, não deixavam passar”, finaliza Rafael.
Rafael Miranda é motorista de aplicativo - Foto: Assis Fernandes/O Dia
Usuário chegou a ser expulso do carro por motorista
Uma corrida permeada por bate-boca e reclamações. É assim que resume a estudante Luísa Alves, que pediu um carro por aplicativo em uma quinta-feira sem ônibus em seu bairro e acabou sendo expulsa do veículo pelo motorista, porque ele não aceitava corrida no cartão e não queria seguir o trajeto orientado por ela.
“Ele já chegou reclamando que não teria ido me pegar se tivesse visto que a corrida era no cartão sendo que eu havia mandado mensagens antes sobre minha localização e em momento algum ele mencionou isso. No meio do caminho, depois de dizer que não iria seguir o trajeto que pedi porque não era ônibus, ele parou e me mandou descer do carro, porque o veículo era dele e ele levava quem queria”, conta.
Obrigada a voltar para casa depois do ocorrido, Luísa denunciou o motorista na plataforma onde ele estava cadastrado e resumiu a situação em uma palavra. “Humilhação. Quer dizer, até uma coisa que é alternativa pro caos que é o transporte nessa cidade se tornou outro caos”, finaliza.