Os dados divulgados pelo Mapa de Prevenção de Desastres do Serviço Geológico Nacional (CPRM), que apontam que Teresina possui 10 áreas de risco para a ocorrência de desastres naturais, com cinco bairros onde há risco de deslizamento de terra são mais do que simples números. São uma realidade amedrontadora para milhares de famílias que vivem em encostas, barrancos e próximos aos grotões, comuns no cenário urbano da capital.
(Foto: Assis Fernandes / O DIA)
A reportagem do Portalodia.com foi até alguns desses pontos com risco de desastres elencados pelo CPRM - Vila da Paz, Parque Rodoviário, Vale do Gavião, Pedro Balzi e Bela Vista, que possuem construções em áreas com risco de deslizamento de terra - e constatou que o medo de novas tragédias e a desesperança em melhoria desses lugares é a regra.
Vila da Paz: desabamento de 2019 pode se repetir
Dona Maria da Cruz Oliveira, 40, lembra com detalhes a dia em que a casa de taipa em que ela morava na Vila da Paz veio abaixo após uma chuva nesta mesma época do ano, em 2019. Sem ter para onde ir, a solução encontrada pelo genro, o Alberto Nonato, 35, foi levantar uma outra casa de taipa na mesma região de risco. Um ciclo vicioso que, a cada chuva, ameaça a vida dos dois – que são nora e genro – e outras quatro pessoas que moram na casa.
(Foto: Assis Fernandes / O DIA)
Eles contam que o município prometeu remanejá-los para uma casa no Parque Rodoviário, mas até agora está só na promessa. “Justamente por causa de chuvas (como as últimas) a outra casa caiu, aí eu fiz essa daqui para ela”, diz Alberto. “De lá para cá, dentro de quatro anos não fizeram nada. A Prefeitura... só disseram que íamos ser levados para o Parque Rodoviário. Mas cadê? Ainda estão limpando o terreno lá. Aqui tem crianças, idosos” lembra. E ainda questionam: “vamos sair de uma área de risco para outra?”
Na Vila da Paz, a obra é coordenada pela SAAD Sul e o valor está orçado em mais de 23 milhões. A previsão é que deva ser concluída em 14 de setembro de 2023.
Parque Rodoviário: o drama daquele 4 abril perdura até hoje
“Morro de medo quando está chovendo, peguei um trauma. Fico gelada, sem sossego dentro de casa, pensando que vai acontecer a mesma coisa que aconteceu no dia. É tipo um trauma”. O relato é da dona Valdirene Pereira, 54, uma das moradoras do Parque Rodoviário mais afetadas pela enxurrada em 2019. Não só pela casa que foi destruída em 2019. Mas também pela vida do marido, que morreu nas águas tentando procurar a esposa.
(Foto: Assis Fernandes / O DIA)
Para ela, chuva virou sinônimo de tragédia. E a situação se agrava porque as casas que deveriam ter sido construídas ainda não foram entregues. “Estou morando aqui de aluguel solidário. E de lá para cá não mudou nada, está do mesmo jeito. O terreno onde disseram que construiriam as casas está do mesmo jeito. Dizem que vão entregar a casa no mês de setembro, mas acho que não vão não. Não estou vendo nada de vantagem aí. Quando chove fica tudo alagado”, relatou Valdirene.
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Ela denuncia ainda que o aluguel solidário de 300 reais que ela recebe não é reajustado desde 2019 e ainda chegou a atrasar dois meses para a dona do imóvel. “Tenho vontade de sair daqui para um lugar melhor, porque todo ano é a mesma coisa”.
(Foto: Assis Fernandes / O DIA)
Também moradora do Parque Rodoviário, quem também sofre com a demora da reestruturação do bairro após a tragédia de 2019 é Elisângela Pereira, 35. Diferente de dona Valdirene, ela teve uma casa construída pela Prefeitura após perder para a enxurrada o local onde morava. Mas só a moradia não é suficiente. Ela cobra infraestrutura nos arredores da residência.
Depois que os escombros das casas derrubadas pela chuva foram retirados, o que ficou foi areia e mato. Em período chuvoso, essa areia vira lama e o mato cresce tomando conta de tudo. Isso torna difícil e arriscado o acesso às poucas residências que foram reconstruídas no local. Elisângela conta que a falta de limpeza da galeria que passa pela área também não ajuda.
“Ainda no governo do prefeito que faleceu (Firmino Filho), ele construiu algumas casas. A minha foi uma delas e agora está um pouco melhor para minha família. Mas com relação a infraestrutura, aqui quando chove fica tudo alagado, não limparam a galeria. Continua tudo igual”, disse a dona de casa, após atravessar uma região com lama com o filho, um bebê de quatro meses no colo.
Pedro Balzi: moradores da região temem ser as próximas vítimas
Na ocupação São Sebastião, localizada na região do Residencial Pedro Balzi, na zona Sudeste de Teresina, o medo da chuva se justifica pela proximidade a um morro com que as casas foram construídas. A estrutura aparenta estar bem compactada, mas quando chove, o barro se torna oco, o que causa preocupação em quem vive por perto. A cada chuva, a apreensão toma de conta.
(Foto: Assis Fernandes / O DIA)
Quem relata é a moradora Jéssica Félix da Silva. Ela mora há um ano no São Sebastião e diz que quando chove, o que resta para a família é rezar para que o morro sustente e não aconteça uma tragédia. “Aqui na rua não alaga, é mais lá embaixo na avenida. Mas temos medo desse morro, porque se isso ceder, não fica nada. Só que é onde deu para a gente vir morar, então temos que conviver com isso. Infelizmente tem esse medo, mas a gente só reza e pede para não acontecer nada”, relata Jéssica.
Além das casas na base do morro, há ainda várias construções no terreno íngreme ao longo da estrutura rochosa. Algumas delas construídas em meio à vegetação e outras onde a vegetação foi arrancada para dar lugar às moradias.
O que diz a Prefeitura
Em nota, a SAAD Sul informou, por meio da Gerência Habitacional, "que realiza o acompanhamento contínuo das famílias que moram em áreas de risco na Vila da Paz, zona Sul de Teresina. Atualmente, as equipes técnicas de engenharia trabalham na vistoria dessas áreas para constatar o risco do local e as equipes de assistência social realizam o trabalho de negociação e conscientização para que essas famílias deixem as casas."
"A SAAD Sul esclarece que já iniciou o processo de remoção das famílias e que as negociações estão na etapa de assinatura do acordo de indenização e pagamento. Sendo que a prioridade são para aquelas famílias que estão em áreas de risco. A Prefeitura Municipal de Teresina garante a inclusão desses moradores no Cidade Solidária, projeto criado pelo executivo para assistir famílias em situação de risco no período chuvoso, mas algumas famílias recusam deixar suas casas, assim como, recusam assinar o termo de renúncia."
"A SAAD Sul continua acompanhando o processo junto com a Defesa Civil e já enviou à Procuradoria Geral do Município os casos de recusa para que seja judicializada a remoção dos moradores que recusam deixar as áreas de risco. Mas, segue conversando e orientando os moradores, visando novas negociações e a retirada dessas famílias do local o mais rápido possível." A mudança climática que vem ocorrendo no Brasil vem afetando Teresina. As chuvas registradas na capital vem colocando os teresinenses sempre atentos. Em nota, a Defesa Civil Municipal afirmou que vem monitorando as regiões que estão sendo afetadas pelas chuvas registradas. Desde o ano passado, ao todo estamos monitorando as áreas de risco.
Na região do Pedro Balzi, pelo menos 300 famílias tiveram suas residências construídas nas imediações de morros. Com possibilidade de deslizamento é potencializado com as chuvas.A situação é mais crítica nos bairros Vila da Paz, Parque Rodoviário, Vale do Gavião, Bela Vista e Pedro Balzi, em razão do risco de deslizamento de terra. Nessas áreas, muitas famílias vivem em situação de vulnerabilidade e não têm para onde ir. O levantamento feito pela Defesa Civil Municipal em janeiro de 2023, as principais ocorrências estão concentradas em bairros da zona sul, em que há chamados registrados na Vila Irmã Dulce, Vila Afonso Gil, Bairro Ilhotas, já na Zona Norte, se concentraram nos bairros Poti Velho, Água Mineral, Parque Brasil e Santa Maria da Codipi. No Pedro Balzi, localizado na zona sudeste. E na Zona Leste, no Bairro Pedra Mole. Os agentes seguem a postos para atender a população prejudicada pelos temporais.
Comitê emergencial
O Comitê Emergencial está funcionando desde de novembro de 2022 para prestar assistência às vítimas atingidas durante o período de chuvas e monitorar as áreas de riscos de Teresina. Desde o início do Comitê, existe uma equipe de plantão, composta por assistentes sociais e bombeiros. Essa equipe funciona desde de janeiro durante 24 horas, tanto nos finais de semana, como em feriados. Já durante a semana, as ações emergenciais e de socorro às vítimas são realizadas pelas SAADs, mas caso seja necessário, o Comitê é acionado e age imediatamente.
As ações de prevenção a desastres são realizadas pelo Comitê Emergencial, composto por diversos órgãos da Prefeitura, como Secretaria Municipal da Defesa Civil (SEMDEF), as Superintendências de Ações Administrativas Descentralizadas (SAADs), a Defesa Civil, a SEMCASPI, a Fundação Municipal de Saúde (FMS) e a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SEMDUH), além do Corpo de Bombeiros.
Ações
Por medidas preventivas, nossas equipes da Defesa Civil, e do Corpo de Bombeiros Civis continuam de plantão para atender quaisquer eventualidades e seguimos monitorando e prestando toda assistência necessária às famílias. As ações incluem o monitoramento das áreas de risco, a limpeza dos espaços públicos, das galerias, bueiros e bocas de lobo e o atendimento às famílias que ficarem desabrigadas.
As famílias que moram em áreas de risco devem, em caso de emergência, acionar a Defesa Civil Municipal, por meio do 199 ou (86) 3223-7366 para que ocorra o monitoramento da residência e o cadastro inicial. O atendimento da Defesa Civil Municipal é 24h.
Confira mais fotos das áreas com risco de deslizamento: